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Resumo
Vital Didonet, filósofo, pedagogo, e especialista em políticas públicas para a primeira infância e membro da Rede Nacional Primeira Infância fala sobre acertos e desafios da educação infantil pública, experiências internacionais e o papel da família na educação.
“Uma das coisas que precisamos avançar no Brasil é a intersetorialidade no olhar à criança, para que haja um olhar profundo e com unidade”.
“Não dá para fragmentar, a criança é uma pessoa íntegra e precisa ser vista holisticamente”
Essas palavras são de Vital Didonet, filósofo, pedagogo, especialista em políticas públicas para a primeira infância e membro da Rede Nacional Primeira Infância. “Toda educação implica em um olhar cuidadoso e respeito à criança em toda sua dimensão. Não é só aspecto físico, mas o cuidar de seu pensamento, de seus sentimentos”, disse.
Conversamos com ele sobre acertos e desafios da educação infantil pública, experiências internacionais e o papel da família na educação.
Leia a entrevista na íntegra
Lunetas: Falando de Educação Infantil, o que você destacaria como positivo nas políticas públicas do país?
Vital Didonet: Em âmbito nacional, há uma concepção de educação infantil que parte da criança, respeita o seu ritmo e que associa o cuidar e o brincar como duas dimensões de uma mesma realidade, na qual tudo é cuidar, e tudo é brincar.
Lunetas: Poderia citar exemplos?
Vital Didonet: Com atitudes respeitosas e afetivas é possível empoderar as crianças para que elas sejam protagonistas de seu próprio desenvolvimento em atividades simples, do dia a dia. Há diversas escolas e creches trabalhando com um olhar mais atencioso e cuidadoso com o bebê, seguindo os métodos Reggio Emília, Waldorf ou Ammi Pikler.E há experiências muito interessantes, sobretudo nos municípios, da rede pública e de organizações não governamentais, da rede pública algumas secretarias de educação que tem uma proposta pedagógica bem elaborada, construída junto com os professores.
Lunetas: E internacionalmente, quais políticas ou iniciativas você destacaria?
Vital Didonet: O Brasil está seguindo muito com atenção a experiência pedagógica da Itália, onde há experiências maravilhosas em várias regiões. A mais conhecida aqui é a Reggio Emília, uma experiência pedagógica de mais de 50 anos, que parte do princípio de que a criança é capaz, que ela é o sujeito da aprendizagem, ela tem capacidade de aprender. Essa experiência educacional é muito considerada no Brasil.
Lunetas: Qual é o papel da escola e da família na educação da criança?
Vital Didonet: A LDB (Lei de Diretrizes básicas da Educação Nacional) diz que a Educação Infantil é complementar à ação da família. Portanto, reconhece e compreende que a base da educação começa em casa. Desde a gestação, nascimento, os primeiros anos do bebê. A escola, para complementar, tem que compreender qual é a educação familiar, o que a criança está aprendendo em casa e dar sequencia. Não iniciar tudo de novo e nem desconsiderar a aprendizagem familiar.
Lunetas: Como aproximar as famílias da escola?
Vital Didonet: O CEI (Centro de Educação Infantil Onadyr Marcondes), em São Paulo, decidiu conhecer de perto a realidade de seus alunos e passou a realizar uma caminhada anual pelo bairro. Todos os funcionários da escola – professores, merendeiras, vigilantes e da limpeza – caminharam pelas ruas, vielas e becos percorridos pelas crianças e suas famílias e conheceram suas casas e seu território. Os pais precisam se sentir parte do processo educacional, ser reconhecidos como educadores em casa e saber que a escola está dando ou não continuidade ao que ensinam em sua casa.Hoje, há um problema mundial, que no Brasil está muito agravado, que é a terceirização. A família abre mão da educação da criança, entrega o cuidado para a escola, achando que a escola vai dar conta de tudo. E a escola não dá conta, por que falta o vínculo familiar. Tanto o vínculo da família com a criança, quanto o vínculo da educação familiar com a educação escolar. É preciso que os pais participem da elaboração do projeto pedagógico da escola, que as atividades da escolas sejam conhecidas pelos pais, não apenas as questões administrativas e o calendário.Claro, as famílias não têm tempo, moram longe da escola, tem o trânsito, há muios desafios, mas temos que descobrir uma forma de superar essa separação. Além disso, quando não há vínculo, a criança se sente dividida: vou para a escola aprender e em casa não aprendo nada? Tanto a casa quanto a escola são fonte de aprendizagem.
Lunetas: Você já comentou os pontos positivos do país no campo da educação infantil. Quais são os desafios?
Vital Didonet: O maior de todos, e que é também uma solução, é que a educação seja um compromisso, tal como a constituição determina, do Estado brasileiro, e não apenas dos municípios. O Estado tem um papel importante junto aos municípios, de contribuir para a construção de escolas e investir na formação de professores. Tanto a União, quanto os estados tem o dever de dar assistência técnica e financeira aos municípios, essa é uma responsabilidade coletiva.O segundo é ter um orçamento para a Primeira Infância. O Marco da Primeira Infância determina que a união informe quanto de recursos foi alocado para a primeira infância. Mas não se fala ainda na palavra “orçamento criança”. O poder executivo pode criar isso. Com isso, seria possível mensurar resultados e cobrar mais recursos. Entenda o Marco Sete motivos para comemorar a aprovação do Marco Legal da Primeira Infância.Outro desafio é a formação e a remuneração dos professores. Essas duas coisas o Brasil tem que resolver. Já melhorou muito, mas ainda é insuficiente. Qual é a área ou o setor mais sensível, onde deveríamos colocar o profissional mais qualificado? Não é no ensino superior, nem no ensino médio. É na educação infantil. Não tem sentido que um professor da educação infantil ganhe dois mil reais, e outro professor de outra etapa ganhe dez ou doze mil. Temos que realmente enfrentar essa questão da formação e na remuneração. E assegurar que tenhamos os melhores professores na creche.O outro desafio é a questão do currículo. O que realmente temos que dar a oportunidade das crianças vivenciarem como experiências de aprendizagem? A LDB determina que haja uma proposta pedagógica, muitas não tem. Há grandes empresas que vendem material para as escolas. Isso pode ser um problema, pois o material vem de outro estado, e isso contribui para um empobrecimento muito grande da educação infantil, na medida em que ela pode se entregar à definidores externos à escola, comunidade e cultura local.Quando os currículos vem de cima para baixo, para que o professor simplesmente aplique, ele passa a ser somente um aplicador, e sua criatividade termina.Municípios que construíram propostas pedagógicas de qualidade com os professores avançaram muito. Quando participa do projeto pedagógico, o professor recupera o conceito de que ele é o diretor da atividade, de que ele é responsável pela proposta educacional.
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