Quem foi seu primeiro amigo? Para muita gente, lembrar dessa amizade é quase sentir de novo o cheiro do recreio. A ciência tem pistas do porquê isso acontece: memórias afetivas que se formam cedo, brincadeiras que viram treino social e emoções que ajudam a “colar” lembranças no cérebro.
Talvez por isso, quando a professora carioca Esther encontrou uma foto ao lado da amiga de infância Bianca, teve a ideia de procurá-la nas redes sociais. Apesar da recordação de um vínculo bom, ela tinha poucas informações para começar a sua busca. “Só sei que o nome é Bianca e tem uma irmã chamada Bruna, ela se mudou para o Jardim América na época e nunca mais a vi”, escreveu em um post em sua conta no X, em 2023. A publicação viralizou e Esther então encontrou a amiga horas depois.
A amizade entre Helena e Ester, ambas com 8 anos, começou ainda nas barrigas de suas mães, que eram colegas de trabalho e engravidaram no mesmo período. Quando estão juntas, elas adoram fazer penteados, correr pelo parquinho, lanchar e brincar até ficarem cansadas. Talvez agora elas ainda não saibam, mas levarão essas memórias para a vida inteira. “Minhas lembranças com a Ester são sempre de muita brincadeira, bagunça e amor. A gente se ama muito”, diz Helena.
Para Stefany Santos, mãe de Helena, a amizade entre as duas traz empatia e cumplicidade “porque estão passando pelas mesmas fases e vivendo experiências muito parecidas”. Além disso, como são filhas únicas, conta, “elas aprendem a dividir e a resolver conflitos simples, respeitando também o espaço uma da outra”.
Como a ciência explica essa conexão?
Estudos mostram que a parte do cérebro que conecta as emoções e a memória é capaz de processar e armazenar os sentimentos da infância. Por isso, é por causa da amígdala que, quando lembramos das primeiras amizades, podemos sentir novamente a mesma felicidade, como uma nostalgia.
“As pessoas mantêm essa memória, porque viver experiências pela primeira vez tem grande importância”, afirma a psicóloga Elisa Iungano, especialista em psicanálise da criança. “A amizade é uma escolha e uma identificação a partir de um ponto em comum próprio de uma criança pela outra.”
Segundo ela, os vínculos de amizades costumam ganhar força entre os três e cinco anos, quando a criança passa de brincadeiras paralelas para as colaborativas. “Ela começa a guardar mais as lembranças, principalmente as afetivas como as experiências com os amigos.”
Nessa fase, surgem trocas diretas, combinações de regras e identificação. “Essa interação marca um ponto de partida na autonomia da vida social de cada criança”, diz Elisa. Portanto, elas constroem vínculos compartilhando fantasias e reconhecendo os gostos em comum, como acontece com Helena e Ester. “A gente adora salgadinho, gatos e churrasco”, revela Helena. “Nossa brincadeira preferida é pega-pega e esconde-esconde.”
Enquanto as meninas colecionam memórias, firmam um vínculo, como explica Elisa, pois sempre que lembrarem da infância, vão pensar uma na outra. “A recordação se entrelaça com as histórias de vida. É um espelhamento fraternal porque a gente vai se moldando de acordo com as nossas relações e as amizades fazem parte dessa vivência.”
As memórias autobiográficas das primeiras amizades
As tardes da infância de Stefany Santos, mãe de Helena, eram compartilhadas com dona Aparecida. “Minha melhor amiga era uma vizinha idosa, que eu chamava de ‘parceirinha’”, conta. “Eu amava escutar sobre a vida dela, brincar de boneca e os penteados que a gente fazia uma na outra.”
Elisa Iungano também recorda com nitidez a sensação das trocas com a primeira amiga de infância. “Eu morava numa vila e vivia pendurada na janela, olhando para outra menina que também ficava na janela”, conta a psicóloga. “Lembro que era muito gostoso, e nossos pais fizeram uma foto desse momento, que eu guardo até hoje.”
Com o tempo, percebeu que parte dessa lembrança se mistura ao que os pais contavam. Isso porque, “na primeira infância, a gente guarda o sentimento do que viveu e também o que nos narram sobre essas cenas”, diz. De acordo com ela, revisitar momentos que confortam faz parte da chamada memória autobiográfica: um arquivo afetivo que se organiza desde cedo e combina emoção, narrativa e imagens que fomos colecionando.
Para Elisa, a marca da amizade de infância tem um tom afetivo próprio, diferente do vínculo familiar. “É outro tipo de amor: na família, o sentimento já está dado. Na amizade, existe a escolha. Ou seja, você escolhe e é escolhido.” As duas ainda se falam até hoje.
3 filmes sobre amizade para assistir com as crianças
Para se inspirar, que tal fazer uma sessão de cinema com as crianças e os amigos delas para assistirem filmes sobre amizade? Confira as dicas de Lunetas:
Ganhador do Oscar de melhor curta de animação, o filme é uma adaptação do livro homônimo de Charlie Mackesy. A história apresenta a volta para casa do menino, que encontra pelo caminho animais que o inspiram e deixam lições de amizade, respeito e gentileza.
Onde assistir: Apple Tv e Amazon Prime
Luca, Alberto e Julia vivem novas descobertas e aventuras entre as paisagens da Itália marinha e interiorana. Enquanto Luca guarda um segredo, precisa entender sobre lealdade e parceria.
Onde assistir: Disney+
Uma amizade improvável mas cheia de significado e de afeto acontece entre Carl, um vendedor de balões de 78 anos, e o pequeno escoteiro Russel, de 8 anos.
Onde assistir: Disney+
