Aléxys Gabriel tinha 16 anos quando começou a bater de casa em casa, na comunidade do Retiro, em Jaboatão dos Guararapes (PE). Tudo porque seu pluviômetro caseiro, equipamento que mede o volume das chuvas, mostrou que a madrugada seria de mais tempestades e ele sabia que aquela região corria risco de desabamento. Era maio de 2022. Algumas horas depois que os vizinhos deixaram o local, cinco casas desabaram. O aviso só pôde acontecer porque o adolescente sabia da importância da educação ambiental.
Foi nas aulas do projeto educacional “Dados à prova d’água“, do Centro Nacional de Alertas e Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden), em parceria com universidades do Brasil, Alemanha e Reino Unido, que Aléxys e os colegas aprenderam a construir e utilizar o pluviômetro. Tudo foi feito artesanalmente, com garrafa pet. Além disso, eles também aprenderam conceitos sobre as mudanças climáticas e os riscos de desastres ambientais. Entre as atividades, os alunos mapearam riscos e traçaram rotas de fuga para o caso de deslizamentos.
Desse modo, projetos que mobilizam toda a comunidade podem beneficiar regiões que se esqueceram da importância da conexão com a natureza. Além disso, o despertar da consciência ambiental e da crise climática pode inspirar ações transformadoras, vinda dos próprios alunos, como foi o caso de Aléxys e os pluviomêtros de garrafa pet. Confira outros projetos ambientais que mobilizaram a comunidade:
Filtros de água com caroços de açaí
Em 2012, com a orientação do professor de química, o estudante Edivan Pereira, 18 anos, construiu filtros de água com caroços secos de açaí. Assim, o projeto serviu para purificar a água consumida pela comunidade ribeirinha e evitar doenças. Na época, ele fazia parte do Clube de Ciências de Abaetetuba, mesmo morando no município de Moju, cidades do interior do Pará.
A região é uma das maiores produtoras do fruto do país e, nas comunidades ribeirinhas, muitas famílias não têm acesso à água tratada. Na pesquisa, Edivan verificou que 64% das pessoas tiveram doenças relacionadas ao consumo dessa água. Então, a partir das propriedades do açaí como fonte de carbono, ele desenvolveu um tipo de carvão capaz de filtrar e purificar a água. Era a solução para melhorar a qualidade de vida da comunidade. Assim, ele conquistou vários prêmios, como o Jovem Cientista e o Jovens Inventores. Hoje, ele repassa o conhecimento em aulas de capacitação para alunos do ensino médio de escolas públicas do Pará.
Limpeza do rio e reflorestamento
Observando o rio Lajes, em Porteirinha (MG), toda vez que caminhava de casa para a escola, a estudante Maria Isabela Araújo, 17 anos, se inquietava. Ninguém chegava perto da margem, a vegetação estava prejudicada e a água estava poluída. Maria, que era a “diretora de meio ambiente” do grêmio estudantil de sua escola sugeriu, então, aos professores e colegas que fizessem algo para mudar a situação e reconectar a comunidade à natureza. Foi assim que surgiu o projeto “O rio que queremos”.
Os estudantes visitavam as casas para falar sobre a importância do rio e de plantar mudas nativas do norte mineiro, doadas por ONGs locais e pelo Instituto Estadual de Florestas. Eles também mapearam os principais problemas ambientais do entorno e organizaram rodas de conversa com representantes da prefeitura e associações. Essa mobilização mudou a relação da comunidade com o rio, despertou a consciência ambiental para além da escola e rendeu a participação no programa Desafio Criativos da Escola, de 2018.
Conhecimento ancestral e respeito à natureza podem “adiar o fim do mundo”
A sabedoria ancestral junto à conexão direta com a natureza fizeram os irmãos Lesly, 13 anos, Soleiny, 9, Tien, 5 e Cristin, 1, sobreviverem 40 dias perdidos na Amazônia colombiana. Após um acidente de avião, em maio de maio de 2023, as quatro crianças indígenas da etnia huitoto foram as únicas sobreviventes.
Apesar de estarem em local de mata fechada, a irmã mais velha liderou uma caminhada em busca de mais comida e água. Ela arrumou uma mochila com farinha de mandioca, lanterna e uma garrafa vazia e, junto aos irmãos, passava os dias caminhando pela floresta, colhendo frutos, coletando água da chuva. À noite se abrigavam para dormir. Na época, a mídia chamou o caso de “milagre”, mas para as lideranças indígenas, não havia dúvidas de que os saberes originários ajudaram a “adiar o fim do mundo”.
Vanda Witoto, enfermeira e líder indígena da mesma etnia das crianças afirmou à BBC que a sabedoria ancestral foi que salvou os irmãos. “A educação se dá no cotidiano e na observação dos fazeres dos mais velhos. Desde cedo, as crianças são levadas para a roça e aprendem como cuidar e manejar a natureza, quais folhas, frutas e raízes podem comer ou como procurar rios, pescar e confeccionar instrumentos básicos”.
Apesar de ainda não ser uma disciplina formal, a Base Nacional Comum Curricular orienta que as escolas cumpram a Lei nº 9.795, que prevê a educação ambiental como um “componente essencial e permanente da educação nacional”. De acordo com a lei, a temática deve estar presente em todos os níveis da educação, de forma articulada, com atividades dentro das avaliações ou extracurriculares. Assim, estudantes aprendem sobre preservação da natureza e conscientização da crise do clima nas aulas de ciências, biologia, química e física, por exemplo.