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Cena do livro “Fios”

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3 gerações de mulheres se conectam em 3 livros para crianças

Foto de três mulheres de três gerações diferentes, avó, mãe e filha. Todas são negras e estão se abraçando e sorrindo

Um xale, memórias da escola e o adoecimento de um familiar inspiraram a criação de três narrativas conectadas por um fio invisível: os laços de três gerações de mulheres. Escritos também por mulheres, “A costura”, “Amanhã” e “Fios” trazem à tona experiências cheias de afeto para dividir com crianças de todas as idades.

Com a proposta de valorizar a cultura palestina por meio de seus objetos, Isol, a autora argentina de “A costura”, conta em uma entrevista que recebeu um xale feito naquela região e a encomenda do Museu Palestino de criar um conto infantil para o projeto “Palestinian Art History as Told by Everyday Objects”. Ao observar as imagens que formavam os bordados da peça, começou a ver cenários. Assim surgiu a história do Lado da Frente, o mundo em que vivemos, e do Lado de Trás, com seus mistérios e criaturas estranhas.

Lúcia Hiratsuka nos convida a acompanhá-la no caminho para as escolas da avó, da mãe e de suas próprias memórias de infância. Além das histórias de família, caraterística muito presente na obra da autora paulista, “Amanhã” traz três contos que entrelaçam as culturas japonesa e brasileira e mostram a escola como espaço coletivo de transformação social onde se pode “esperançar” novos caminhos possíveis.

Já em “Fios”, a rede de apoio de mulheres que se costurou quando sua avó adoeceu e se tornou dependente de cuidados inspirou o livro de Chris Nóbrega. Para contar essa história, a obra foi toda feita em família: os bordados são da mãe da autora, Maria Freitas, e as ilustrações ficaram a cargo do sobrinho Gabriel Dutra.

Conheça mais detalhes sobre cada um dos 3 livros:

Bordados e seus avessos

“Vamos começar pela aldeia onde vivemos: temos árvores frutíferas, casinhas vermelhas triangulares, muitas flores e um rio no meio.
Cada coisa tem seu lugar, tudo arrumado e bonitinho. Parece até com os bordados que minha avó faz.
Ao mesmo tempo, dizem, existe outro mundo, bem atrás do nosso, muito mais inusitado, com paisagens cheias de nós, linhas penduradas e estranhos animais. […] Mas esse lugar só pode ser visitado em sonho” – (Trecho de “A costura”)

“A costura”, Isol (Pequena Zahar)

Por entre linhas, bordados, tramas e costuras, Lila conduz os leitores em uma aventura fascinante em busca do que se perdeu no lado de cá e do que acontece no avesso do mundo. Para aplacar os questionamentos da mãe sobre as coisas perdidas, a menina tenta explicar sua teoria que envolve o mundo em que vivemos e o lado de lá, que só pode ser visitado em sonhos. A ideia é simples: basta costurar todos os buracos que com o tempo surgiram por aqui e onde certamente caem as coisas perdidas. Mesmo contra a vontade da mãe – que culpou as histórias que a avó contava pelo excesso de imaginação da filha, Lila empunhou linha e agulha e saiu para consertar os buracos do mundo (e parar de perder seus pertences). Mas esta solução traz consequências para o Lado da Frente e o Lado de Trás. É graças à cumplicidade entre avó e neta que os remendos começam a se desfazer. Dividido em cinco partes — as coisas perdidas, os buracos, a névoa, solstício e o epílogo — o desfecho surpreende pelas possibilidades que guardam o avesso do mundo, nem sempre como imaginamos.

A caminho da escola

“Assim que passamos a pequena ponte, num curto lá adiante, está ela de madeira, a pintura de cal lavada pelas chuvas,
as portas e janelas olham para a estrada.
A escola! Dentro do amanhã.” – (Trecho de “Depois da ponte”, do livro “Amanhã”)

“Amanhã”, Lúcia Hiratsuka (Pequena Zahar)

“Amanhã tem escola?”, perguntam três meninas. Com os delicados traços da artista plástica, entre cores que brotam da terra ou chegam de longe, entre espanto e ansiedade, surgem palavras, desenhos e cantos que mostram as trilhas de três gerações para o amanhã em três contos ilustrados. O desejo comum das protagonistas – a própria autora, sua mãe Sayuri e sua avó Orie – é ir à escola. Tudo começa com mãe e filha na máquina de costura criando um porta-marmitas, que seria levado para a escola. “Depois da ponte”, o conto que abre o livro, é memorialístico. Hiratsuka conta no posfácio que recolheu imagens, cheiros e cores do caminho para a escola para compor as paisagens do sítio Asahi — que significa sol da manhã —, no interior de São Paulo, onde ela nasceu e cresceu. Ao retornar da escola, a menina mostra satisfeita seu caderno e pergunta se a mãe ia às aulas quando era criança. A resposta amplia a curiosidade: “no meu tempo era diferente, a escola mudava de lugar…”. Em “Caminho das amoreiras”, Sayuri conta que, em vez do sol da manhã, o que acompanhava as crianças até a escola eram lanternas, pois era preciso estudar sem chamar a atenção. Durante a Segunda Guerra Mundial, o governo brasileiro proibiu por um período o uso da língua japonesa e chegou a fechar escolas. Apesar disso, Sayuri e outros imigrantes resistiram e seguiram seus estudos. No terceiro conto “Tooryanse”, que é também o título de uma cantiga popular japonesa que a autora adaptou livremente nesta narrativa, conhecemos a história da avó Orie, que estudou no Japão e tinha como professor um monge. Para ir e voltar da enorme escola cheia de janelas, Orie precisava passar por um bambuzal. Era a cantiga que lhe dava coragem para atravessá-lo.

Fios que bordam afetos

“Naquele dia uma virava mãe e a outra avó. A avó, a mãe e a menina desde aquele dia seguiram juntas.” – (Trecho de “Fios”)

“Fios”, Chris Nóbrega e Gabriel Dutra (Maria Cobogó Coletivo Editorial)

Neste retrato dos afetos que unem três gerações de mulheres e suas memórias de infância, sempre que necessário, as mais velhas consertam vestidos rasgados, joelhos ralados e corações partidos. As mais novas aprendem cantigas e a origem dos sentimentos. O bordado da vida une essas mulheres e as mãos – sempre em evidência nas imagens – bordam, costuram, cozinham, afagam e seguram outras mãos, quando se apoiar é preciso. As mesmas mãos também podem enxugar lágrimas e espantar o medo diante do esgarçamento dos fios da vida. De forma delicada, esta narrativa enxuta fala da morte como despedida, em uma página que inspira o silêncio. Logo em seguida, um nascimento. Entre nascer, viver e morrer, “Fios” borda — literalmente — a rede de afetos que se forma quando chega um bebê e quando alguém querido se despede. É pelo ponto do bordado que se acompanha a passagem do tempo, o amadurecimento da neta, os ciclos quando a mãe vai assumindo papéis e o esquecimento da avó.

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