Uma criança pequena que vive em situação de pobreza pode ter um atraso de até 12 meses no desenvolvimento em relação a outra criança com menos privações. É o que indica os primeiros resultados de uma pesquisa inédita sobre a educação infantil e o bem-estar na primeira infância. Realizada pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a avaliação foi aplicada na Estônia, Inglaterra e Estados Unidos e chegará este ano ao Brasil.
É a primeira iniciativa global para avaliar aspectos de aprendizagem entre crianças com cinco anos ou menos. Esse período é essencial para o desenvolvimento cognitivo e emocional. Conforme as avaliações iniciais, há um descompasso no conhecimento básico numérico, operacional, de linguagem, memória e nas habilidades de autorregulação entre crianças de diferentes contextos sociais. Ou seja, meninos e meninas que vivem em condições de mais pobreza estão, comprovadamente, mais atrasados. A principal preocupação, segundo os pesquisadores, é não deixar que essas crianças permaneçam em desvantagem por toda a vida.
Como será no Brasil?
A proposta não é aplicar uma prova às crianças pequenas. Mas escutar professores e famílias sobre o desenvolvimento de cada uma delas a partir de um questionário padrão. Crianças de escolas da rede pública e particular serão avaliadas por meio de brincadeiras e histórias, com a ajuda digital de um tablet. Nesse momento, um pesquisador estará presente para ajudá-las, mas sem interferir em suas respostas.
A expectativa é que os primeiros testes no Brasil ocorram a partir de março, para avaliar a logística e condução dos pesquisadores locais. Conforme a primeira experiência, somente em 2025 acontecerá a coleta efetiva de dados de aproximadamente 4 mil crianças em 280 escolas. O objetivo é ter um retrato da primeira infância brasileira e um diagnóstico para conduzir projetos e políticas públicas específicas para a população menor de cinco anos.
“Somos o único país do Hemisfério Sul que participa dessa pesquisa. Os resultados poderão ser usados como bússolas para monitorar, avaliar, estabelecer rotas de correção e criar metas palpáveis para as diferentes políticas que se relacionam ao desenvolvimento e à educação infantil”, diz, em nota, Mariana Luz, CEO da Fundação Maria Cecilia Souto Vidigal, que é parceira da OCDE na realização da pesquisa.
Outras avaliações monitoram o impacto das desigualdades sociais
A OCDE também é responsável pelo Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa), que considera habilidades de estudantes de 15 anos em matemática, leitura e ciências por quatro anos consecutivos. O último resultado (de 2018 a 2022), então, mostrou que 50% dos estudantes brasileiros não conseguem encontrar a ideia principal em um texto e 73% têm baixo rendimento em matemática. O Brasil ocupa o 64º lugar no ranking geral de 80 países. O Pisa também revelou que os alunos mais ricos alcançaram 77 pontos a mais em matemática, por exemplo, do que os mais pobres.
Esses resultados mostram como os efeitos das desigualdades sociais acompanham a vida escolar da criança até a adolescência. Por isso, especialistas defendem a urgência de programas governamentais para o início da vida, como diz a pesquisadora e professora da Faculdade de Educação da Universidade de Harvard, Dana McCoy. “Embora nunca seja tarde demais, investimentos precoces são mais vantajosos e têm mais retornos. Nem todas as crianças expostas a adversidades experimentarão resultados negativos.”