Um estupro acontece a cada 8 minutos. Dos 34 mil casos registrados no país só neste primeiro semestre, em 75% as vítimas tinham menos de 14 anos ou eram mulheres incapazes de aprovar consentimento. Os dados são do relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. O estudo mostra que as meninas nesta faixa etária sofrem mais abusos sexuais do que mulheres adultas.
Além disso, houve um aumento dos casos de violência contra a mulher em todo o país. O número de 772 feminicídios é um recorde desde a primeira versão do levantamento, em 2019. Os registros da região sudeste elevaram 2,6% esse índice em relação ao ano passado. O estado de São Paulo teve mais ocorrências do crime, com 111 casos.
E o direito ao aborto?
Entre os principais efeitos na saúde física e psicológica das vítimas de violência, o relatório do Fórum Brasileiro de Segurança Pública lista a gravidez indesejada. Esse fator ainda esbarra na dificuldade em conseguir informações e garantir um serviço público para o aborto legal, previsto como direito em casos de estupro. Segundo o documento, “além de conviver com o trauma da violência sofrida, muitas das vítimas – a maioria crianças – ainda são obrigadas a gestar o fruto dessa violência ou procurar serviços clandestinos de abortamento”.
Enquanto a votação sobre a descriminalização do aborto não acontece, iniciativas para o procedimento legal no Brasil buscam dar suporte às vítimas. O guia produzido pelo Instituto AzMina, por exemplo, reúne dados oficiais sobre internações, despesas hospitalares e mortes. Tem também registros de aborto legal e o perfil das pessoas que abortam. Segundo o instituto, todos os anos, 25 mil meninas vítimas de estupro com menos de 14 anos têm filhos em vez de acessar um aborto.
Educar as crianças é uma forma de prevenção
A delegada Raquel Gallinati, diretora da Associação dos Delegados de Polícia do Brasil, comenta a declaração de que “o Estado brasileiro segue falhando na tarefa de proteger suas meninas e mulheres”, presente no relatório. Para ela, “medidas preventivas poderiam contribuir para a redução desses crimes, evitando que cheguem ao extremo”, especialmente quando as vítimas são crianças e adolescentes.
“É essencial investir em políticas públicas educacionais, capacitação de profissionais e campanhas de conscientização. Isso tudo cria um ambiente seguro e solidário, promovendo a denúncia e o suporte às vítimas desde cedo”, diz. O caminho, segundo ela, é prevenir pela educação, com “programas que promovam o respeito, igualdade de gênero e relacionamentos saudáveis ainda na infância.”
Além disso, para combater a violência contra a mulher, deve-se investir no sistema de justiça e segurança pública, garantindo a efetiva implementação das leis, fiscalização e penas mais severas, ressalta. “Estrutura e treinamento adequados para policiais que lidam com casos de violência também levam à prevenção do feminicídio.”
O Governo Federal se comprometeu a diminuir os casos de violência contra a mulher, a partir de programas do Ministério da Mulher, que propõem medidas de prevenção, acolhimento e segurança. Dentre eles está o “Pacto Nacional de Prevenção aos Feminicídios” e o “Brasil sem Misoginia”, que envolvem mais de 100 entidades sociais e do governo para enfrentar o problema.
Mais segurança para as mulheres
Ao completar 17 anos, a lei 11.340, conhecida como Lei Maria da Penha, passou por mudanças em 2023. Agora, qualquer caso de violência doméstica e familiar contra a mulher, independente da condição da vítima pode se enquadrar na lei. O texto também estabelece medidas protetivas de urgência desde o momento da denúncia. Além disso, prevê a criação de serviços especializados e responsabiliza os agressores, como explica a delegada Raquel Gallinati.
Onde denunciar?
Se você é vítima ou conhece alguém que sofre violência contra a mulher, ligue 180 para falar na Central de Atendimento à Mulher. A ligação é gratuita, a identidade é mantida em sigilo e a linha funciona 24 horas em todos os dias da semana. Além de contar com uma escuta especializada para acolher mulheres em situação de violência, o serviço oferece informações sobre os locais de atendimento mais próximos do endereço da vítima.
Outro canal de denúncia é o WhatsApp (61) 9610-0180, exclusivo da Central de Atendimento à Mulher. A atendente virtual “Pagu” fornece informações e aciona a qualquer momento o serviço individualizado da ligação telefônica.
Desde 2015, considera-se feminicídio o crime decorrente de violência doméstica e familiar contra vítimas do sexo feminino, em razão de discriminação e menosprezo à condição de ser mulher. Justamente por ser uma legislação recente, o relatório alerta para as subnotificações de feminicídio, muitas vezes registrado como homicídio comum. Por outro lado, o aumento desses registros reflete mais informações disponíveis sobre como identificar e julgar o crime.