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‘A criança não dorme, e agora?’ 15 questões sobre a hora do sono

Uma mulher adulta e um bebê estão lado a lado na hora de dormir. A roupa de cama é em tons de azul

Uma necessidade vital como dormir – tão natural quanto comer e respirar – pode ser algo problemático na vida de quem tem filhos. Para algumas crianças, ir para a cama significa deixar uma brincadeira que estava legal ou mesmo a companhia dos pais. Elas, obviamente, ainda não têm a maturidade para entender que uma noite mal dormida pode afetar o dia seguinte. 

Na busca por conseguir fazer as crianças dormirem, muitos adultos acabam recorrendo a inúmeras formas: treinamentos, dicas, chás, livrinhos, massagem. O que será que realmente funciona? Tem mesmo que tirar a soneca da tarde? Criança tem que dormir cedo? O Lunetas conversou com especialistas para sanar as dúvidas e desbravar o universo do sono infantil e ajudar os pais nessa tarefa.

A biologia do sono

Crianças que dormem a noite inteira são o sonho de muitos pais, porém, do ponto de vista biológico, não se pode almejar isso logo de início. “Dormir sozinho, a noite toda, é, na maioria dos casos, uma construção social. Se bebês na época das cavernas gostassem de dormir longe dos pais por muitas horas seguidas, certamente a humanidade não estaria aqui, teríamos sido devorados por ursos ou leões”, explica a pediatra Jackeline Santim. “Embora hoje tenhamos casas seguras, livres de predadores, o instinto do bebê ainda pede para estar próximo de seus cuidadores para adormecer e voltar a dormir quando acontece um microdespertar entre os ciclos de sono”, diz. 

No entanto, conforme cresce, a criança pode ser estimulada a dormir sozinha, como ressalta a psicóloga infantil Fernanda Dantas. “Isso vai depender da decisão dos pais, mas, geralmente, entre os dois e quatro meses, ela é liberada para dormir a noite inteira pelo pediatra”, detalha.

Obviamente, dormir é algo natural. Porém, o sono infantil pode ser bem peculiar. A pediatra lembra que a busca pelos cuidadores, durante a noite, é uma forma de as crianças seguirem seus instintos de sobrevivência. “Em nossa realidade atual, alguns hábitos noturnos, como mamar de madrugada, podem representar um problema para os pais, que também precisam de uma noite de sono de qualidade”, diz. A psicóloga lembra que a criação de uma rotina é um dos segredos para facilitar a hora do sono das crianças.

As burocracias do sono

“Sim! O ideal é que elas durmam até 20h-21 horas. Assim, irá aproveitar melhor o hormônio que regula o sono, a melatonina, e adormecerá mais fácil”, explica a pediatra. Segundo ela, é comum que as crianças despertem pela manhã sempre no mesmo horário, independentemente da hora que foram dormir. Então, dormir mais cedo ajuda a garantir as horas de sono que elas precisam.

É importante lembrar que as necessidades de sono das crianças vão mudando conforme crescem. Se nos primeiros meses elas precisam dormir cerca de 16 horas, aos cinco anos, esse número já cai para 10 horas, sendo que, no início, elas precisam das sonecas diurnas e, depois, passam a não precisar mais. Vale ter isso em mente na hora de definir a hora de dormir e despertar das crianças.

Assim como a quantidade de horas de sono, o tempo que elas podem ficar acordadas, sem ficarem exaustas, também varia de acordo com a idade. É o tempo que os especialistas chamam de “janela do sono”. “Após esse tempo, há uma grande probabilidade de que o bebê, por exemplo, fique muito cansado, liberando o hormônio do estresse, o que o deixa irritado, choroso e com dificuldade de adormecer”, esclarece Jackeline. Ela detalha que nem sempre o pequeno dá pistas óbvias de que está com sono, como quando boceja. Essa atenção às janelas do sono, sobretudo nos primeiros meses de vida, pode sinalizar aos pais quando ir para um lugar calmo e ajudar o bebê a adormecer. 

A maioria das crianças deixa de tirar a soneca entre três e cinco anos de idade. “Porém, continua sendo importante ter um momento para repousar e fazer atividades mais leves. Em algumas culturas, até mesmo os adultos fazem uma soneca após o almoço”, diz a pediatra.

Agitação, irritabilidade e dificuldade de concentração estão entre os sintomas mais comuns de privação do sono, de acordo com os especialistas.

Influências externas

Cabe aos pais encontrar uma forma de estruturar uma rotina equilibrada e previsível, com momentos de brincadeiras livres, tempo controlado de telas (evitando a exposição perto da hora de dormir), períodos ao ar livre, de preferência na natureza, adesão à uma alimentação saudável e períodos propícios ao descanso, como ressalta a pediatra. 

A psicóloga pontua que a dinâmica familiar interfere muito no sono infantil. Por exemplo, a falta de rotina pode provocar uma desorganização e a criança não saberá a hora que vai dormir. O relógio biológico fica desregulado, pois toda noite ela dorme em um horário diferente. “A interação dos pais também pode interferir no sono. Ela pode ter passado o dia na escola ou em atividades que gastem energia, mas mesmo cansada, ela vai ficar acordada para estar com os pais e receber atenção”, detalha. Até mesmo no caso dos pais que passam o dia com o filho, mas sem tempo de qualidade, pode ocorrer de, em algum momento, a criança demandar atenção, como na hora de dormir.

Melhores estratégias para a hora de dormir

“A melhor estratégia é criar uma rotina, com hora certa para a criança se acalmar da atividade que estava realizando e se preparar para dormir. Vale levar para a cama, diminuir a luz, ler um livro, colocar uma música relaxante ou mesmo acolhê-la até ela dormir”, recomenda a psicóloga.

A especialista em sono infantil, Cláudia Aguiar recomenda que os pais busquem informações para entender o universo infantil. “Para dormir bem, a criança precisa ter suas necessidades biológicas e emocionais atendidas, fase a fase. São várias as engrenagens a considerar do dia a dia, mas vale a pena respeitar o que elas precisam para tudo fluir melhor”. A seguir, ela lista alguns pontos a levar em consideração: 

Maturidade – A criança não tem o mesmo tipo de sono que os adultos. Por uma questão de sobrevivência, quando nascem, precisam se alimentar à noite, posteriormente, precisam de bastante descanso diurno, além do noturno, e uma boa alimentação. É importante que os pais alinhem as expectativas do que é normal e esperado para cada fase.

Previsibilidade – Toda criança precisa ter um dia previsível, com horários similares, especialmente para acordar e dormir, pois isso as deixa mais seguras e tranquilas. Isso não significa ter horários fixos o dia todo, mas prestar atenção em alguns momentos para ajudar na regulação do relógio biológico infantil. Os cuidadores precisam ainda pensar em um ciclo de atividades adequadas para cada idade, incluindo descanso, brincadeiras/atividades e alimentação, observando as necessidades da criança e respeitando-as.

Afeto – A criação do vínculo também ajuda na hora do sono. “A criança que se sente amada e segura, só por isso já dorme melhor. Ler histórias desde bebezinho, brincar, tomar banho junto, cantar, dançar, dar colo, amamentar, tudo isso cria conexão”, lembra a consultora.

Polêmicas do sono

Sim. Essa é uma resposta bem fácil. A pediatra explica que as telas emitem luz azul, que inibe o hormônio do sono, a melatonina. Então, mesmo uma programação mais calma pode atrapalhar o início do sono. Segundo ela, o ideal é evitar a exposição ao menos uma hora antes de colocar a criança para dormir.

Deixar o bebê chorando pode até fazê-lo dormir, mas o preço é alto. “Nesse caso, o sono será mais breve e agitado, pois a estratégia o deixa estressado. Devemos lembrar que o choro é a comunicação do bebê: ele está alertando que precisa de algo. O colo é um lugar de acolhimento e de proteção. Quando chora e não é acolhido, pode sentir-se desamparado, o que irá causar prejuízos em seu desenvolvimento afetivo”, explica a psicóloga. Segundo ela, o mais indicado é acolher o bebê, sempre que ele chora e entender o motivo do choro.

“A criança que passa por um ritual gostoso, no início da noite, está bem alimentada, gastando energia, aprendendo, se desenvolvendo e se sentindo amada vai dormir bem, não há necessidade de nenhum treinamento”, detalha Cláudia. Ela recomenda, no entanto, evitar “maus hábitos” desde cedo, pois tudo para a criança é aprendizado e, quando algo se torna hábito, é mais difícil remover depois.

Segundo a psicóloga, no caso dos bebês, isso pode ajudá-los a dormir melhor, pois assim eles têm o calor dos pais, se sentem seguros. Porém, essa é uma decisão de cada família. 

“Muitas famílias encontram na cama compartilhada um modo de suprir as necessidades de todos seus integrantes: crianças se sentem seguras e são atendidas em seus microdespertares com a presença de seus cuidadores, atrapalhando pouco ou nada o sono dos pais. Quando todos estão felizes e a dinâmica funciona, que mal há? Porém, há muitos pais que não desejam ou não conseguem um sono de qualidade com a cama compartilhada. Para essas famílias, é possível lançar mão de técnicas e estratégias para que a criança durma por si só”, avalia a pediatra.

Quando bebê, dormir na cama dos pais não prejudica o desenvolvimento de autonomia, mas, conforme cresce, ela deve ser encorajada a ser independente. Ao ganhar confiança em si mesma, a criança não precisa mais da proteção e validação constante dos pais, podendo explorar e ocupar seu próprio espaço no mundo, como sugere Fernanda. 

Caso os pais percebam algo de errado no sono das crianças e não tenham conseguido sucesso nos métodos adotados, é preciso buscar um especialista. “É importante que os pais conversem com o pediatra de confiança sobre as dificuldades. Na consulta, o médico vai avaliar a rotina, o ambiente, hábitos e associações de sono”, diz Jackeline.

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