Para onde vai o lixo que descartamos? A gente até pode tirá-lo de dentro de casa, mas todos os resíduos seguem habitando o planeta. E essa convivência não é pacífica, viu. O descarte incorreto de tudo que consumimos pode causar um enorme estrago ao meio ambiente.
Então, anota aí a primeira lição que é separar os resíduos em três partes: orgânicos (coador de café, restos de verduras, legumes ou frutas, papel sujo ou molhado), que vão para a composteira doméstica; recicláveis secos (papel, lata, plástico, vidro), que vão para o ecoponto; e os rejeitos, que não podem ser aproveitados (papel higiênico, sobras de comida temperada, restos de carne e fezes de animais).
Restos de comida, por exemplo, não se decompõem sozinhos. Das quase 2 bilhões de toneladas de resíduos úmidos ou orgânicos que produzimos por ano, metade acaba em aterros sanitários. Além de liberarem uma grande quantidade de gás metano, um dos principais gases causadores do efeito estufa, ao se misturar com outros tipos de resíduos, gera o chorume, que é tóxico, porque contém substâncias como metais pesados e medicamentos, além de contaminar os lençóis freáticos e, consequentemente, os alimentos que consumimos.
Se considerarmos a realidade latino-americana, uma única pessoa que composte todo o resíduo úmido gerado (restos de frutas, verduras e outros tipos de comida) pode evitar o acúmulo de 150 quilos de material orgânico nos aterros sanitários por ano, evitando a emissão de 60 quilos de metano na atmosfera.
Então, que tal aproximar as crianças desse processo desde cedo e envolver a família toda na tarefa de separar e compostar os resíduos orgânicos da sua casa?
“As crianças são importantes agentes na nossa sociedade, tendo participação ativa e poder de influenciar as pessoas com quem convivem”, considera Gabriela D’Amaral, gestora ambiental e analista de educação do Instituto Akatu. Assim, “promover a consciência sobre o consumo e a gestão de resíduos entre as crianças pode resultar em uma maior compreensão sobre como suas ações influenciam o seu entorno, estimulando que sejam protagonistas em um mundo mais sustentável”, sugere.
“Quanto mais cedo incentivamos a conscientização entre as crianças, mais enraizada será a noção da importância de se gerar menos resíduos, reutilizar ou reciclar o que geramos, e da adoção e promoção de hábitos mais sustentáveis”
Para que seja parte da rotina, “as crianças devem participar desde o planejamento da compra, passando pelo uso dos produtos, a separação dos resíduos e sua destinação final, sendo envolvidas nas decisões e colocando a mão na massa”, diz. Gabriela sugere ainda associar as tarefas a algo lúdico, como uma competição de quem gera menos resíduos com os vizinhos, por exemplo.
Como construir sua própria composteira
Cascas de frutas, legumes e verduras, cascas de ovo, pó de café e até papel molhado podem se transformar em adubo. Já frutas cítricas, fezes de cães e gatos, alho e cebola, carnes, nozes pretas, trigo, comida temperada e plantas doentes não devem ir à composteira, pois comprometem a degradação da matéria orgânica e atraem animais.
No trato com os resíduos orgânicos, as crianças têm a oportunidade de “aprender sobre o ciclo de vida dos produtos, sobre os impactos do desperdício, além de maneiras simples de se conscientizarem sobre o melhor uso desses recursos”, pontua Gabriela.
Segundo ela, a construção da composteira é “uma atividade que promove essa reflexão sobre não desperdiçar alimentos, sendo uma solução simples para dar destinação adequada aos resíduos orgânicos”. Então, convide a criança para participar!
Vocês vão precisar de:
- Três caixas ou baldes plásticos
- Uma torneira
- Furadeira
- Um punhado (120g) de minhocas californianas, ou vermelhinhas, encontradas em casas de pesca ou em grupos de compostagem nas redes sociais, em que as doações são frequentes. Essas minhocas comem 50 vezes o próprio peso por dia, aceleram o processo e melhoram a qualidade do adubo.
- Serragem para cobrir as camadas de resíduos úmidos (é fundamental que seja sem verniz, porque a química mata as minhocas). A serragem evita o mau cheiro e a proliferação de insetos, fungos e aqueles mosquitinhos que geralmente infestam as lixeiras. Você também pode usar folhas secas na cobertura.
Para alimentar a composteira, é preciso intercalar camadas úmidas e secas, com atenção à última camada, sempre seca, que deve ter o dobro de volume da úmida. A composteira deve sempre ficar na sombra e em um local abrigado, para que, caso chova, a água não escorra pelos furos destinados à entrada de oxigênio.
Lembrete: quando você trocar a caixa de cima pela de baixo, não precisa adicionar minhocas: elas subirão pelos furinhos entre as caixas, em busca de comida. Enquanto você enche a segunda caixa, a outra estará produzindo húmus a partir da decomposição dos alimentos (que pode ser usado como adubo para plantas). O processo de compostagem leva, em média, três meses.
E os resíduos secos, como destiná-los adequadamente para a reciclagem?
A má gestão de resíduos que poderiam ser reciclados também é nociva ao meio ambiente. Mas, além de reciclar o que é descartado, devemos pensar em consumo consciente e na origem dos produtos que consumimos, por exemplo. Reduzir o volume de resíduos e recusar qualquer tipo de material que você não precisa, especialmente embalagens, é o melhor caminho para ser mais sustentável.
Para ajudar o pessoal da triagem, remova os restos de comida dos descartes. Você pode aproveitar o guardanapo usado para limpar as embalagens antes de lavar ou deixar as embalagens dentro da pia, para que sejam lavadas com a mesma água utilizada para a louça.
Antes de reciclar…
O que é resíduo para você pode ser fonte de diversão para as crianças. Então, vale convidá-las a explorar esses materiais com criatividade, incentivando-as a criarem brincadeiras de forma ativa e livre, sem as interferências do brinquedo “pronto” que é comercializado. A gestora ambiental Gabriela também recomenda fazer comentários com exemplos que se relacionam ao cotidiano delas: “sabia que com todo esse plástico conseguimos produzir mais um daqueles seus carrinhos?”.
Na hora de separar os resíduos para reciclagem, “as crianças sempre devem ser acompanhadas por um adulto responsável, principalmente no caso do manuseio de objetos cortantes (como o vidro), usar EPI adequado, aprender a identificar o símbolo da reciclagem na embalagem dos produtos, a maneira adequada de separá-los, a identificação dos coletores de materiais recicláveis”, diz a especialista.
O que e como reciclar?
Abaixo, esta série com ilustrações mostra como destinar corretamente os materiais para a reciclagem – e aqueles que não conseguimos reutilizar de jeito nenhum. Clique na seta ao lado da imagem para saber mais.
O tempo da natureza
Ao ensinar às crianças que na natureza tudo se transforma, ou seja, nada é “lixo”, estimulamos valores e práticas que contribuem para repensar a maneira como consumimos e a grande quantidade de resíduos que geramos, pondera Gabriela. Além disso, falar em resíduos é falar também em responsabilidade compartilhada e em como aproveitar melhor os recursos naturais, por exemplo.
“A aprendizagem vai além das questões ambientais, abordando aspectos sociais e econômicos, em uma perspectiva mais completa, de sustentabilidade”
“Abordar os conteúdos relacionados ao consumo consciente e sustentabilidade desde a primeira infância, por meio de brincadeiras e de atividades lúdicas, além de formar cidadãos e cidadãs mais conscientes no futuro, traz benefícios como o desenvolvimento da autonomia, da curiosidade, da forma de ver o mundo, e da construção de relações saudáveis e mais equilibradas com o coletivo e com o meio ambiente”.
* Esta reportagem derivou de duas publicações originais do portal Believe.Earth: “15 dicas para separar seu lixo” e “Como compostar seu lixo”. Para sua adaptação ao Portal Lunetas, colaboraram Laís Barros Martins (nova redação e entrevista) e Sheila Ana Calgaro (infográficos).
** As ideias e sugestões trazidas nesta matéria são uma forma de estimular que nós, adultos e crianças, possamos rever nossos hábitos de consumo e tenhamos uma atitude mais sustentável. Contudo, sabemos que ações individuais, sozinhas, não são a solução para enfrentar a emergência climática ou evitar desastres ambientais. A solução deve vir da união global entre estados, empresas e organizações comprometidas em garantir um meio ambiente saudável para as atuais e futuras gerações.
Leia mais
Que tal substituir “lixo” por “resíduos”?
Precisamos parar de falar “lixo” a tudo que descartamos. Isso porque “lixo” – tecnicamente chamado de rejeito – é algo que não serve para mais nada. Já os resíduos têm valor, desde que corretamente separados. Com esta pequena mudança, as crianças vão incorporar a palavra no seu vocabulário de forma natural.