O mundo está mudando mais rápido do que nunca. Os problemas estão cada vez mais complexos e, para lidar com eles, precisamos de pessoas empáticas e protagonistas. O que as escolas transformadoras tem a ver com isso?
Algumas escolas têm respondido e essa pergunta com ideias inovadoras e soluções criativas. Além de transmitir conhecimentos acadêmicos, elas se preocupam em formar sujeitos ativos. Estes devem ser capazes de atuar no mundo de maneira criativa e sensível e oferecem aos seus educandos uma formação que valoriza o desenvolvimento de habilidades e competências transformadoras.
A Ashoka e o Instituto Alana aceitaram o desafio de buscar, apoiar e conectar escolas de todo o país que estão criando esse caminho rumo a uma educação verdadeiramente transformadora. Juntas, as instituições percorreram o Brasil e reconheceram as primeiras 10 escolas para fazerem parte da rede Escolas Transformadoras.
Na última quarta-feira (16) um encontro em São Paulo apresentou as escolas reconhecidas. Além disso, recebeu a criadora do projeto Design for Change, a indiana Kiran Bir Sethi, como convidada especial e palestrante. “Idade não tem nada a ver com competência”, afirmou em uma de suas falas.
Conheça as escolas brasileiras transformadoras
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1. Escola Municipal Anne Frank – Belo Horizonte (MG)
A Escola Municipal Anne Frank está localizada no bairro Confisco, comunidade de alta vulnerabilidade social no região da Pampulha em Belo Horizonte (MG). O terreno foi doado pelo médico pediatra Marx Golgher. Por sua origem judaica, deu à escola o nome de Anne Frank. A curiosidade dos alunos sobre a origem do nome culminou na criação, em 2008, do Projeto Anne Frank Viva. Ele contempla pesquisa ativa sobre a história da família Golgher e estudo sistematizado sobre o holocausto. A partir destas pesquisas, as crianças são apresentadas às questões de justiça, igualdade, respeito, diversidade étnica e cultural e direitos humanos.
Por meio do projeto, os alunos aproximam-se da história de vida de Anne Frank. Inspirando-se e transpondo muitas das vivências da pequena menina judia para as particularidades de seus cotidianos, muitas vezes marcados por relações de conflito e violência. A escola posiciona-se claramente como um polo de construção de uma cultura de paz, que engloba relações além-muros. A comunidade escolar construiu, na praça em frente à escola, o Bosque da Paz. Mensalmente, eventos e festas da escola, como a Festa Junina. Esta ocupação do espaço público é entendida como fundamental dentro do programa político-pedagógico da escola, pois amplia o repertório e as vivências dos alunos. Além de contribuir para que o lazer e o conhecimento tomem conta do espaço, combatendo a violência local.
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Escola Municipal Professor Paulo Freire – Belo Horizonte (MG)
A Escola Municipal Professor Paulo Freire nasceu em 2001, no bairro Ribeiro de Abreu, na periferia de Belo Horizonte (MG). Pela carência de oportunidades, muitas crianças da comunidade viam-se excluídas da educação básica e vulneráveis à violência. O sonho de ver um espaço de formação às crianças e jovens mobilizou lideranças locais e, após empenho de diferentes atores, nasceu a escola, assumindo como identidade o nome do mestre homenageado e a visão de Educação Popular. O poder de articulação, que possibilitou a criação da escola, se tornou uma marca expressiva no programa político-pedagógico adotado.
Há uma aposta permanente no acolhimento e respeito ao outro e na valorização da escola como ambiente democrático, produzido e cuidado por todos. O prédio conta com sala audiovisual, biblioteca, informática, laboratório, quadra poliesportiva e horta e todos são responsáveis por sua manutenção. Desde a fundação, a escola é aberta à comunidade. Nos finais de semana funciona como um espaço social e cultural para receber as famílias. Essa ação tem o objetivo de estreitar laços e favorecer a apropriação e o empoderamento da escola pelas crianças e jovens.
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3. Escola Comunitária Luíza Mahin – Salvador (BA)
A Escola Comunitária Luíza Mahin nasceu em 1990 a partir de uma iniciativa da Associação de Moradores do Conjunto Santa Luzia (BA). Tem em seu nome forte representação e valorização da cultura afro-brasileira. Luiza Mahin se tornou símbolo de luta e resistência negra, configurando um mito para a população afrodescendente. Sem documentos ou quaisquer registros materiais que atestem sua existência, ela entrou para a História pela escrita do filho, o poeta e precursor do abolicionismo no Brasil, Luiz Gama.
Mas não é apenas o nome da escola que valoriza a cultura negra. Frente às desigualdades raciais, a equipe trabalha para diminuir as diferenças de oportunidades e conectar os alunos, majoritariamente afrodescendentes, às suas raízes e histórias, colocando-os como centro do processo de aprendizagem. Por sua natureza comunitária, a escola é permeada por relações colaborativas, tanto nas dinâmicas cotidianas, como na própria sustentabilidade financeira da instituição. Durante seus dois primeiros anos de existência, a escola se manteve com recursos próprios. Muitas vezes oriundos da arrecadação direta da própria comunidade. A partir de 1992, passou a contar com o recurso financeiro fruto de parcerias e doações .
Pautada na metodologia de alfabetização de Paulo Freire e Emilia Ferreiro, a escola trabalha para aumentar os níveis de alfabetização de jovens e adultos da Península de Itapagipe. Para diversificar as oportunidades de formação profissional continuada e para aumentar o acesso de mais crianças dessa região ao Ensino Fundamental e a Educação Infantil.
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4. Escola Vila – Fortaleza (CE)
A Escola Vila tem como seu principal objetivo trabalhar os valores humanos, a consciência ecológica e a cidadania, para que seus alunos possam, com suas atitudes, assumir a responsabilidade e o compromisso com a busca de alternativas para a melhoria da qualidade da vida no planeta Terra. A escola se preocupa em trabalhar as emoções e os sentimentos das crianças. Especialmente com atividades expressivas e artísticas, como aulas de música, teatro, artesanato e artes plásticas e também por meio de trabalhos de consciência corporal e meditação.
A consciência ecológica também é desenvolvida, por meio de vivências na Farmácia Viva, Horta, Fauna, Pomar, Jardim, e estudos sobre saúde e alimentação, tecnologias alternativas e manutenção. Essas atividades acontecem como aplicação dos conteúdos curriculares e sempre integradas a eles. A escola oportuniza ainda a vivência de hábitos de vida mais saudáveis por meio de refeições com alimentos in natura, refeições não industrializadas, preparações de fabricação própria, e (das) dinâmicas nutritivas e avaliação nutricional.
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5. Escola Rural Dendê da Serra – Serra Grande (BA)
Fundada em 2011 por um grupo de pais e professores, a Associação Pedagógica Dendê da Serra concretizou o sonho de uma escola Waldorf adaptada à realidade local. Atualmente, a escola atende, em sua maioria, alunos provindos de baixa renda da vila e da zona rural, no Município de Serra Grande, em Uruçuça, na Bahia. A escola está mergulhada em valores como cooperação e empatia. E também se traduz por uma pedagogia holística, que se debruça em bases antroposóficas, tendo em vista a evolução física, emocional e espiritual do ser humano.
Privilegiam e promovem o trabalho em equipe, para que os alunos exercitem o respeito frente à diversidade, valorizem as potencialidades de cada um. E também troquem experiências, favorecendo um ambiente enriquecedor. O trabalho conjunto é evidenciado desde a organização dos funcionários da escola, corpo docente, pais e membros da comunidade para garantir o funcionamento da associação até as atividades desenvolvidas em sala de aula.
A escola Dendê da Serra integra crianças de classes sociais diferentes. Cerca de metade dos alunos são da comunidade e recebem uma bolsa integral. A associação, desta forma, a fim de garantir o ensino a todos e promover a integração social, recebe parte do investimento de agentes financiadores (doação de empresas). E outra parte é de um sistema de apadrinhamento de crianças, no qual membros da sociedade civil podem custear parcial ou integralmente a formação de determinados alunos.
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6. EMEF Desembargador Amorim Lima – São Paulo (SP)
A escola tem um longo histórico de lutas e transformações na pedagogia e na sua estrutura física desde a entrada da diretora Ana Elisa Siqueira em 1996, com participação ativa da comunidade de pais e a colaboração de pesquisadores voluntários. Em 2003 iniciaram o processo de maior transformação na pedagogia da escola, derrubando as paredes das salas de aula e formando grandes salões de aprendizagem. O principal diferencial da escola segundo os alunos é a grande liberdade e autonomia que possuem para aprender no seu ritmo e de acordo com seus interesses. Uma vez que não há salas de aulas com um professor e alunos em carteiras enfileiradas, professores e alunos estão a todo tempo convivendo e trabalhando em equipe.
Os conflitos na escola não são velados, todos tem bastante espaço para colocar suas opiniões e fazer críticas, apesar disso a empatia é a base das relações entre todos na escola e há bastante afetividade e respeito presentes nas relações. O surgimento de líderes democráticos entre alunos, pais e professores na escola é bastante natural, e eles tem abertura para liderar iniciativas com apoio da gestão da escola. Os alunos demonstram protagonismo, conduzindo seu processo de aprendizagem e avaliação, participando da gestão da escola, fazendo críticas com liberdade e propondo iniciativas. Toda gestão da escola acontece com a participação efetiva de pais e alunos que participam em diferentes instâncias no cotidiano da escola.
7. Escolas Amigos do Verde – Porto Alegre (RS)
Um recanto verde em meio à vida agitada de Porto Alegre. Ao adentrar a Escola Amigos do Verde, podemos ver crianças brincando em meio à natureza, em diversos espaços abertos, numa área de proteção ambiental de 3000m². A Escola tem como missão proporcionar a aprendizagem integral do indivíduo dentro de uma visão ecológica de sustentabilidade. Busca acolher a diversidade, respeitando as particularidades e a riqueza inerentes a cada um. Todas as atividades curriculares são desenvolvidas e integradas às atividades de auto(eco)conhecimento (expansão da consciência) como massagens, relaxamentos, danças circulares e rodas de harmonização.
Plantar, alimentar animais, colher frutas, produzir papel reciclado, separar o lixo e reutilizar materiais são exemplos de atividades agroecológicas vivenciadas diariamente, proporcionando qualidade de vida e aprendizagens significativas, sempre por meio da experiência. O currículo é transdisciplinar: por meio de projetos de estudos definidos por consenso, se fortalece o desejo de aprender, com significado para a vida, não objetivando somente provas e avaliações específicas. Ao invés do protecionismo, a escola trabalha a autonomia e respeita a forma de organização de cada criança.
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9. EMEF Acliméa Nascimento – Teresópolis (RJ)
Atualmente a escola atende a 250 crianças oriundas predominantemente de famílias das classes D e E. Em função do contexto social, a escola tem como foco a educação integral das crianças e famílias e um olhar intersetorial, envolvendo profissionais e parceiros da área da saúde, assistência social, entre outros. A escola é de Ensino Fundamental I, ciclo I (1º ao 4º ano) e funciona em período integral. É a primeira escola do município a implantar o Programa Mais Educação, promovendo um diálogo entre as oficinas de múltiplas linguagens do e o currículo oficial, criando assim um modelo estratégico para integrar os currículos e propostas, de modo a atender as necessidades dos alunos e da comunidade.
A proposta pedagógica da escola é pautada nos Projetos de Trabalho que também define sua missão: “garantir a aprendizagem de qualidade para todos os alunos, por meio de uma metodologia que promova a formação reflexiva, crítica e autônoma do aluno”. O fato de o currículo ser aberto exige criatividade, curiosidade e pesquisa por parte dos alunos e professores, potencializando a escola como um espaço de aprendizagem para todos.
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9. Colégio Equipe – São Paulo (SP)
A escola define sua maneira de trabalhar como Metodologia Problematizadora de Ensino. Muito inovadora no momento em que apareceu como alternativa de ensino democrático nos final dos anos 60, no momento mais duro da ditadura militar. Ela foi um verdadeiro polo de resistência cultural, aberta a shows e exposições de artistas que eram proibidos na época. Até hoje, essa tradição se mantém. E o Colégio Equipe é referência em formação política e intelectual. Todo o enfoque da escola é para criar experiências de espaço público na comunidade escolar, deixando que a escola seja o espaço da criança e do adolescente. Ela preconiza a empatia e o trabalho em equipe de modo transversal.
Os atuais “equipanos” podem fazer trabalho voluntário às segundas e terças-feiras, com projetos como leituras e atividades lúdicas para pacientes infantis. Também participam de viagens de estudo do meio que incluem visitas a usinas na poluída Cubatão e a plantios em Ribeirão Preto, no interior paulista, onde entrevistam cortadores de cana. No último ano do Ensino Médio, podem escolher como aulas extracurriculares cursos como “História e Cinema” e “Religião e Ideologia”, além de terem de produzir uma monografia. Não por acaso, existe uma tendência de seus ex-alunos trabalharem em áreas sociais, educacionais e estarem envolvidos em movimentos de transformação social.
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10. Colégio Viver – Cotia (SP)
A escola está localizada em uma grande área verde, afastada da cidade, o que garante a diversidade e riqueza de sua proposta. Situada em Cotia, na Granja Caiapiá, o Colégio entende que sua participação no desenvolvimento dos alunos consiste em mediar a relação da criança com o conhecimento, permitindo o desenvolvimento pessoal de processos lógicos, de habilidades (cognitivas, sociais e afetivas), de valores e de atitudes. Os alunos contam com ambiente intelectualmente desafiador e emocionalmente seguro, com atenção individualizada e espaço para participação nas decisões. A escola trabalha por projeto desde 1998, quando apostaram na capacidade das crianças se apropriarem da ação e do conhecimento através da escolha, participando da elaboração do planejamento de seus projetos desde os seis anos.
Nestas assembleia, os alunos discutem juntamente com os gestores uma pauta comum, acordada coletivamente. Nesses momentos, exercitam o reconhecimento e o respeito às diferenças e a capacidade de discurso e escuta de acordo com as opiniões diversas. A escolha do tema/assunto/objeto/projeto é absolutamente livre, para que o aluno se dedique àquilo que realmente deseja, quer, gosta, se interessa e/ou faça sentido em seu processo de aprendizagem.
Assim como o currículo tem participação direta dos estudantes, a escola entende o processo de avaliação de forma compartilhada e processual. Cada aluno mantém um portfólio e realiza sua própria auto-avaliação. Paralelamente, cada estudante elege um professor–tutor, que irá acompanhá-lo na condução da sua aprendizagem, dificuldades acadêmicas e projetos de vida.
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