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Violência obstétrica: precisamos falar de parto nas novelas

As cenas em que a personagem de Ellen Roche dá à luz são uma sequência de erros e de violência obstétrica.

A dramaturgia é uma linguagem universal que faz parte da vida de muitas pessoas. Ela tem um papel muito importante, já que, diferente da cultura, da saúde e da educação, tem um alcance enorme e consegue acessar muitos lugares, atingir uma boa parcela da população.

Por isso, o compromisso da dramaturgia com o conteúdo é coisa séria, muito séria. Você já parou para pensar como as novelas e o cinema, por exemplo, retratam o parto? E você já se deu conta que depois de parirem, pouco aparecem os recém-nascidos e quase nunca essas puérperas amamentam as crias?

Pois é. Precisamos falar, com urgência, da forma como a TV e o cinema reproduzem a cultura do parto, principalmente do parto natural, e de como isso influencia na cultura de toda sociedade. Afinal, boa parte do país – falando agora em Brasil, se informa pela televisão.

A novela “O outro lado do paraíso”, da Rede Globo, trouxe à tona novamente essa pauta e, mais uma vez, vemos o descompromisso com a informação de qualidade. Em um dos capítulos, a personagem Suzy (Ellen Roche) entra em trabalho de parto, e as cenas que mostram o desenrolar da história são preocupantes.

Reprodução/Rede Globo

Precisamos observar e refletir sobre como as novelas e filmes retratam o parto e o aleitamento

As cenas são um festival de violência obstétrica, mostrando para o público uma série de condutas médicas as quais devemos abolir, e não naturalizar. Foi então que a jornalista Giovanna Balogh, autora do blog Mães de Peito, resolveu elencar os sete erros do parto na novela e esclareceu algumas das informações erradas.

Confira abaixo o texto, que foi publicado no Facebook:

  1. A gestante sente contração e todo mundo sai correndo para o hospital como se o bebê fosse escorregar como um quiabo. Não é preciso ter pressa ao sentir as primeiras contrações, pois os bebês levam tempo para nascer ainda mais em uma primigesta (mãe de primeira viagem)
  2. Ao dar entrada na maternidade, a paciente já aparece de touca, camisola e com sorinho plugado. Durante todo o parto ela está coberta com panos e mais panos e lençóis.
  3. A parturiente passa o parto todo DEITADA. A posição de litotomia não é indicada pois aumenta – e muito – as dores das contrações. Seria lindo se tivesse mostrado um parto verticalizado.
  4. O médico obstetra fofo na hora do parto diz que ela não tinha passagem, que a abertura estava “estreita, mas ele já alargou um pouco”. Ou seja, fez uma episiotomia na parturiente. Ele fez puxo dirigido mandando ela fazer forças.
  5. O bebê nasce, não vai para o colo da mãe. É levado para exames e somente depois vai para a mãe. Bebê quando nasce saudável precisa só de contato pele a pele e pode ser examinado no colo materno.
  6. O bebê é levado para o berçário quando o lugar de bebê saudável é ao lado da mãe. Ainda muito comum nas maternidades, a prática já deveria ter sido abolida. Lugar de bebê saudável é no quarto com a mãe.
  7. Assim que volta para o quarto, a mãe fala que quer amamentar que está “transbordando” de leite. Uma mãe recém-parida tem primeiro colostro, ou seja, demora para o leite jorrar.

Por essas e outras, temos mulheres sofrendo as mais diversas formas de violência obstétrica todos os dias nos hospitais do nosso país. Retratar algo tão sério e importante como o parto exige uma grande responsabilidade, afinal, do outro lado da tela existem milhões de meninas e mulheres que esperam seus bebês e que não sabem ao que podem ou não serem submetidas.

“Ah, vocês são muito cheias de mimimi, é só uma novela. Precisamos pensar que não é só isso. Ao ver esse tipo de cena, muitas mulheres vão achar que é normal serem tratadas assim e que tais procedimentos são normais e indicados”, completa Giovanna no post.

Precisamos, de uma vez por todas, mudar a forma como o parto natural é representado. Novelas e filmes devem trazer informação de que este é um momento único e deve acontecer de maneira respeitosa tanto para a mãe como para o bebê.

Essa é uma questão séria, de saúde pública e de direitos da mulher. Não é só ficção, não é exagero. Enquanto continuarmos reproduzindo cenas e discursos como este, as mulheres continuarão vulneráveis.

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