Em recente passagem pelo Brasil, o jornalista e ativista norte-americano Richard Louv, que é autor de nove livros, e fundador da Children & Nature Network, participou do I Seminário Criança e Natureza e convocou famílias, educadores, formuladores de políticas públicas e gestores públicos a partirem para a ação. “A consciência [em relação à importância do contato com a natureza] tem crescido ao longo da última década, mas precisamos avançar mais rapidamente para um modo de ação”, defende o pesquisador.
“As experiências no mundo natural oferecem grandes benefícios para a saúde psicológica e física, e para a capacidade de aprender de crianças e adultos”
Conversamos com ele sobre caminhos para aproximar famílias da natureza, educação infantil, políticas públicas inovadoras, cidades para crianças e muito mais.
Leia a entrevista com Richard Louv
- Lunetas: Você é jornalista, como escolheu sua causa e tornou-se um ativista?
- Richard Louv: Eu cresci em Missouri e no Kansas, e sempre passei muito tempo com meu cachorro no bosque que havia no entorno do local onde morávamos. Por isso, pude perceber, ainda menino, o quanto esse tipo de experiência era importante. No começo dos anos 80, durante minha pesquisa para um livro, entrevistei por volta de três mil crianças e seus pais por todos os Estados Unidos, nos centros urbanos, periferias e áreas rurais. E o tema da relação das crianças com a natureza sempre vinha à tona, tanto nas salas de aula, quanto nas casas das famílias. Eu não pude deixar de notar a crescente separação entre o jovem e o mundo natural, e as implicações sociais, espirituais, psicológicas e ambientais desta mudança. E, por fim, havia as perguntas dos meus próprios filhos sobre as mudanças que eles mesmos observavam.
- Lunetas: Poderia mencionar algum estudo científico importante que mostre evidências de que brincar na natureza impacta positivamente a saúde e o desenvolvimento das crianças?
- Richard Louv: As pesquisas sobre o tema têm se expandido muito nos últimos anos. O mundo acadêmico está olhando para esse assunto há pouco tempo, então a maioria das evidências é de co-relação, não causal, embora haja uma tendência de apontar para uma direção: de que as experiências no mundo natural oferecem grandes benefícios para a saúde psicológica e física, e para a capacidade de aprender de crianças e adultos.As pesquisas sugerem fortemente que o tempo na natureza pode ajudar muitas crianças a aprender a construir a confiança em si mesmos; reduzir os sintomas de Déficit de Atenção e Hiperatividade; acalmar crianças e ajudá-las a se concentrar.Escolas com espaços para brincadeiras e aprendizado ao ar livre impactam positivamente os resultados acadêmicos das crianças.Há, também, indícios de que as brincadeiras ao ar livre podem reduzir o bullying, assim como obesidade infantil e excesso de peso, por oferecerem outros benefícios para a saúde psicológica e física. O tempo gasto na natureza não é, obviamente, uma cura para tudo, mas pode ser uma grande ajuda, especialmente para as crianças que são forçadas por circunstâncias além de seu controle.
- Lunetas: Qual é a sua opinião sobre a pediatria contemporânea?
- Richard Louv: Os pediatras estão entre os profissionais de saúde mais abertos à ideia de atividade natureza como uma forma de terapia e prevenção de problemas de saúde. Eles estão começando a “prescrever” a natureza. O Dr. Robert Zarr , de Washington criou um extenso banco de dados sobre parques urbanos da lá para compartilhar com outros pediatras que queiram indicar para as famílias.
- Lunetas: Há alguma política pública que você considere inovadora e que contribua para aproximar as famílias da natureza?
- Richard Louv: Estamos vendo progresso. Um exemplo é a “Every kid in a Park” (Toda criança em um Parque, em tradução livre), uma política pública do governo americano, que oferece um passe anual gratuito para qualquer parque nacional para crianças e suas famílias. Também estamos vendo os pediatras “prescreverem” a natureza para as famílias.Em Washington, em 2012, a União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) aprovou uma resolução declarando é um direito de toda criança ter uma ligação positiva com a natureza.
- Lunetas: Na sua opinião, como seria a cidade perfeita para a infância?
- Richard Louv: Uma em que nossas vidas estivessem tão imersa na natureza todos os dias como estamos imersos na tecnologia. Não há uma cidade perfeita, ainda. A Children & Nature Network está em uma nova parceria com a Liga Nacional de Cidades, com uma adesão de mais de 19 mil prefeitos e outras autoridades municipais, com o objetivo de determinar o que constitui uma cidade rica em natureza, determinar parâmetros para avaliar e acompanhar a evolução dessas cidades, e capacitar futuros prefeitos e outros líderes cívicos.Eu gostaria de desafiar cada uma das cidades do Brasil a desafiarem a si mesmas a se tornarem a melhor cidade do país para crianças e natureza – ou a cidade mais rica em natureza no mundo.
- Lunetas: Como a educação infantil pode contribuir para trazer as crianças mais perto da natureza?
- Richard Louv: Além da pesquisa que eu mencionei anteriormente, outros estudos têm relatado, escolas que usam salas de aula ao ar livre, ganhos no aprendizado das crianças em diferentes matérias e também melhorias em habilidades relativas à resolução de problemas, pensamento crítico e tomada de decisão melhorada.Além disso, há estudos que sugerem que o tempo em ambientes naturais também estimula a criatividade das crianças.
- Lunetas: Em 2005 você lançou o ” Transtorno Nature Defict “, desde então se tornou uma voz importante disseminar esse conceito . Que progressos foram alcançados? E o que você espera alcançar?
- Richard Louv: Estou animado com o progresso em todo o mundo, da China para os EUA para o Brasil. No Brasil, o Instituto Alana, lançou o seu mais novo projeto, Criança e Natureza, que será um ponto focal de ações e debates sobre o tema.Mas, em última análise, nosso progresso será medido menos pelo número de programas e mais pela extensão da mudança cultural. Tenho o prazer de informar que, em 2012, a União Internacional para a conservação da natureza (IUCN) aprovou uma resolução declarando que toda criança tem o direito humano a uma conexão positiva com a natureza.