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Obesidade infantil: ‘confinadas, as crianças não brincam mais’

A obesidade é considerada pela Organização Mundial de Saúde um dos mais graves problemas de saúde pública do mundo. De acordo com o mapa da obesidade da Abeso (Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica), se as devidas medidas não forem tomadas para combater esta questão, a projeção é que até 2025 existam mais de 75 milhões de crianças obesas no mundo todo.

No Brasil, o cenário é desfavorável, com índices alarmantes e crescentes de sobrepeso infantil, o que se acentua nas regiões mais pobres no país – na região Nordeste, a obesidade entre as crianças de cinco a nove anos é de 28%, e de 16% entre os pequenos a partir de dez anos.

De acordo com o “Panorama da Segurança Alimentar e Nutricional na América Latina e Caribe”, este relatório aponta que 7,3% das crianças menores de cinco anos estão acima do peso, sendo que as meninas são as mais afetadas, com 7,7%. Diante desse cenário preocupante, quais medidas tomar?

A endocrinologista pediátrica Lea Diamant, da Clínica de Especialidades Pediátricas do Hospital Albert Einstein, aponta para alguns fatores predominantes: o excesso de industrializados e o tempo passado em frente às telas. O primeiro, motivado sobretudo pela publicidade infantil, enquanto o segundo é induzido principalmente pela falta de tempo das famílias. Ambas são reflexo de um sistema que coloca o ser humano em um processo constante de afastamento de seu corpo e sua mente. Inevitavelmente, uma coisa leva à outra, formando um ciclo perigoso de maus hábitos que iniciam na infância e se perpetuam pela vida toda.

O sedentarismo e o excesso de tecnologia

“Além da alimentação industrializada, com menor consumo de frutas e vegetais, o aumento do número de horas em frente às telas e a menor prática de exercícios físicos. As crianças ficam confinadas em apartamentos e não brincam mais ao ar livre como antigamente”, diz Diamant.

O crescimento das cidades e transformação das sociedades impactou diretamente na violência urbana, levando muitas famílias a recorrer a apartamentos e condomínios fechados, o que influenciou diretamente no modo de brincar das crianças. No lugar das vivências livres na rua, possibilitadas pela segurança de um território protegido, entra um cotidiano pautado em hiperestímulos visuais e sonoros que não trabalham o físico.

Por conta desse cotidiano comprimido em ambientes fechados, a opção dos passeios do fim de semana influencia ainda mais na qualidade de vida dos pequenos; assim, os pais devem perceber se estão oferecendo alternativas ao ar livre, que favoreçam o movimento do corpo, a prática de esportes, e a conexão da criança com seu próprio corpo.

“Atualmente, para que uma criança tenha atividade física é necessário matriculá-la na natação ou envolve-la em algum esporte, que será praticado por cerca de uma hora ao dia, quando no passado as crianças passavam a tarde na rua, andando de bicicleta, patins, jogando bola, e, portanto, gastando muito mais calorias”, pondera a profissional.

Obesidade: uma construção social

A doutora explica que existe uma dificuldade recorrente de os pais de crianças obesas compreenderem que a obesidade infantil é um processo biológico, sim, mas principalmente social. Ou seja, desde que nascemos, estamos sujeitos aos estímulos da publicidade, que nos induz a alimentos e bebidas que prometem facilitar o dia a dia, como enlatados, congelados e processados de alto valor calórico e baixo índice nutricional.

Reverter essa lógica não é fácil e requer uma mudança de postura gradual e consciente, que envolve toda a família.

A importância das escolhas – o que isso quer dizer?

Para a endocrinologista, os exemplos dos pais não acontecem somente na hora das refeiçoes, mas está relacionada a todas as escolhas que a família faz, desde a opção por este ou aquele produto, até os passeios do fim de semana, passando pelos horários de sono e de regularidade na hora de planejar as refeições.

Porém, na prática, a teoria muitas vezes é outra. Oferecer uma alimentação saudável exige um tempo e uma dedicação que muitas vezes os pais e cuidadores não têm, nem mesmo para si mesmos, o que leva à questão das referências negativas transmitidas em casa. Assim, qual o limite entre entender a importância de oferecer boas referências de hábitos e comportamentos e de fato culpabilizar os pais pelos problemas de saúde da criança – que, sabemos, é estimulada não só pela família, mas muito pela publicidade infantil?

A pediatra é otimista, e destaca a disposição para fazer o que for possível dentro de cada contexto familiar.

“Mesmo com pouco tempo, pode-se oferecer opções mais saudáveis, prestando atenção nas calorias dos alimentos consumidos, diminuindo o teor de açúcar e gordura dos alimentos, oferecendo mais alimentos frescos. Para mães e pais que trabalham tenho indicado serviços que fornecem refeiçoes balanceadas com calorias controladas”.

Alguns fatores de alerta

Pensando nisso, Lea Diamant nos ajuda a listar alguns caminhos possíveis para simplificar as escolhas saudáveis no dia a dia.

Consumo x Impactos na saúde

Saber de onde vem a comida que está na mesa, conversar sobre consumo, explicar a relação entre saúde e nutrição. Tudo isso é fundamental para construir as bases da relação com a comida que a criança vai poder levar para a vida toda.

O projeto Criança e Consumo enumerou algumas tomadas de atitude simples de incluir no dia a dia com as crianças, que investem em uma presença ativa dos pais e uma escuta interessada nas dúvidas que eles podem desenvolver sobre o assunto. Afinal, quanto mais diálogo, mais diálogo, e é preciso estar preparado para dar continuidade ao processo, a fim de estimular o interesse. Veja algumas dicas:

Para aprofundar a reflexão sobre o assunto, o Ministério da Saúde elaborou o Guia Alimentar para a População Brasileira, que apresenta recomendações alimentares para a população.

*Este conteúdo foi produzido pelo extinto Catraquinha em setembro de 2017, em parceria com o Hospital Israelita Albert Einstein. Em maio de 2018, o Catraquinha migrou para o Lunetas.

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