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Carlos González: ‘Nossa tendência é comer saudável

Mãos de criança comendo nuggets com batata frita e maionese

Os motivos para uma criança fazer escolhas ruins na hora de comer – e isso também se aplica àquelas que nem sequer se interessam pela comida – tem uma relação direta com o contexto em que ela está – família, escola, convivência social. Daí a importância de oferecer aos pequenos o máximo de opções saudáveis possível na hora da alimentação. É o que defende o pediatra espanhol Carlos González.

Para ele, a tendência natural do ser humano é comer de forma saudável, mas o bombardeio da publicidade em torno de alimentos ruins mascara essa escolha. “Que tipo de alimentos são dados junto a um brinquedo ou um jogo de cartas? Guloseimas”, pondera González.

“O fabricante sabe que nem mesmo uma criança iria comer essa porcaria se ele não oferecesse um brinquedo junto”

“Ninguém dá um jogo de cartas com castanhas ou maçãs, simplesmente porque não é necessário”, provoca o pediatra.

Prestes a lançar o livro “Meu filho não come!” (Editora Timo), González virá ao Brasil no dia 19 de novembro (sábado), em um evento promovido pela editora Timo, para falar sobre hábitos alimentares na infância e as necessidades afetivas das crianças (sono, contato físico e choro), além do lançamento do livro “Meu filho não come!“.

Mas afinal, por que é tão difícil iniciar os pequenos em uma alimentação saudável, consciente e conectada com os benefícios de um corpo bem nutrido? Para González, o segredo está em uma palavra: escolha. Para ele, uma criança que cresce fazendo escolhas se tornará um adulto mais consciente e menos suscetível a publicidade. “A publicidade é a maior prova de que nossa tendência é comer saudável”, defende.

“Se desde a infância formos capazes de escolher, por toda a nossa vida escolheremos muito bem”

Conhecido por assumir uma postura muitas vezes contrária à de fontes de informação tradicionais ou mesmo de profissionais mais rígidos que defendem a criação repleta de limites, o pediatra é um defensor da autonomia infantil.

“As crianças estão naturalmente sujeitas à autoridade de seus pais, e ninguém finge o contrário”

“Somos nós, os pais, que decidimos onde a família vai viver, que escola a criança frequenta, qual alimento, móvel ou roupa compraremos. A questão é: essa autoridade que temos vai ser usada de forma razoável e responsável ou seremos ditadores obsessivos?”, pondera o pediatra.

Confira a entrevista completa

Carlos González – Para o pediatra, como para qualquer outro médico, o respeito à autonomia do paciente é uma exigência ética fundamental. Além disso, é preciso reconhecer – tanto da parte dos profissionais quanto dos pais – que a educação da criança tem sido hipermedicalizada absurdamente.

Nós, pediatras, damos conselhos demais, mas é que os pais nos pedem conselhos demais. Perguntam como educar a criança, como criá-la, o que fazer quando ela chora, como lavar suas roupas, onde colocá-la para dormir, coisas que teriam de fazer os avós.

Carlos González – Para esclarecer alguns conceitos: “criação com apego” [o termo que costumamos usar aqui no Brasil é esse] não é um termo muito correto, porque todas as crianças têm apego, que é uma necessidade básica do ser humano. Muitas pessoas, quando se fala de “attachment parenting” [outro termo comum usado aqui no Brasil], parecem entender apenas “dar muito peito, carregar sempre o bebê nos braços e enfiá-lo em sua cama.

“Attachment parenting” parece-me um termo infeliz, eu nunca o uso. Em “Meu filho não come!”, eu tento explicar aos pais porque as crianças comem muito menos do que eles esperam, e por que não devemos nunca forçá-las.

Carlos González – As crianças têm bem pouca liberdade, isso é um fato. Elas estão naturalmente sujeitas à autoridade de seus pais, e ninguém finge o contrário. Somos nós, os pais, que decidimos onde a família vai viver, que escola a criança frequenta, qual alimento, móvel ou roupa compraremos, quando iremos ao parque e quando voltaremos. A questão é: essa autoridade que temos vai ser usada de forma razoável e responsável ou seremos ditadores obsessivos?

Para González, se desde a infância formos capazes de escolher, por toda a nossa vida escolheremos bem.

Carlos González – Alimentos vegetais são a base de uma alimentação saudável, e todos os médicos devem recomendá-los. Tanto a crianças como a adultos. Mas eu nunca forço um adulto a comer legumes. Uma criança também não deve ser forçada. É simples assim.

“É responsabilidade dos pais ter apenas alimentos saudáveis ​​em casa. Pão e macarrão, frutas e legumes, lentilhas e frango e peixe”

E não ter refrigerantes, bebidas alcoólicas, doces, guloseimas, biscoitos, salgadinhos e junkie food em geral. Entre os alimentos saudáveis ​​que temos em casa, cada criança, como qualquer adulto, decidirá o que comer em todos os momentos.

É muito importante respeitar a capacidade das crianças para decidir o que comer, quanto comer e quando comer (decidir dentro de certos limites, é claro, não se trata de trocar os doces por frutas). É muito importante porque todos nós temos de escolher por toda a nossa vida. E a tendência natural do ser humano é comer saudável. Se desde a infância formos capazes de escolher, por toda a nossa vida escolheremos muito bem.

Aquele que não sabe tomar suas próprias decisões, vai encontrar alguém para dizer-lhe o que comer, e esse alguém não será nem a mãe nem o seu médico. Será a dieta da moda, a da publicidade, a da televisão.

“Quando foi a última vez que você viu anunciarem um alimento saudável na televisão?”

Certamente, a publicidade é a melhor prova de que temos a tendência de comer saudável, naturalmente. Refrigerantes, salgadinhos, doces, precisam ser continuamente anunciados, porque do contrário não iríamos comprar.

“Por outro lado, lentilhas, cenouras, pão (o real, que não carrega nenhum açúcar) vendem-se milhares de toneladas sem fazer um único anúncio”

Que tipo de alimentos são dados, às vezes, junto a um brinquedo ou um jogo de cartas? Guloseimas. O fabricante sabe que nem mesmo uma criança iria comer essa porcaria se ele não oferecesse um brinquedo junto. Ninguém dá um jogo de cartas com castanhas ou maçãs, simplesmente porque não é necessário.

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