No nosso programa chamado Terra de Pequeninos, atendemos famílias de crianças pequenas e, não raro, nos deparamos com situações e dilemas dos pais sobre como educar seus filhos. Frases como: “esse é meu único filho, não tenho ideia do que fazer”, por exemplo, nos fazem parar para pensar no que significa, afinal, educar uma criança, nos dias de hoje.
Se pensarmos em termos históricos, um século atrás, as famílias sabiam exatamente o que fazer quando se tratava da educação dos filhos, a sociedade seguia um padrão pouco questionador e, independentemente dos gostos e interesses das crianças, as famílias seguiam um mesmo padrão de educação em cada meio sociocultural.
Conflitos eram silenciados, muitas vezes nem questionados. Os diferentes não tinham vez, muito menos voz. Aos filhos, cabia sempre obedecer, aos pais orientar o caminho, com autoridade.
O curioso é que alguns saudosistas interpretam esse momento histórico como positivo se comparado com os dias de hoje. Isso porque, apesar de inúmeras consequências emocionais, a coerência das atitudes dos pais gerava segurança nas crianças. E isso é fato. Deixando bem claro: coerência não significa que seja bom, mas, sim, que tinha uma lógica compreensível, que fazia sentido aos filhos. “Falou, está falado!” Simples assim.
Apesar de estarmos vivendo um tempo mais livre, talvez nunca se exigiu tanta perfeição de um pai e uma mãe na educação de seus filhos.
A escola, apesar de pública, era extremamente elitizada, para bem poucos. Havia uma grande preocupação com o comportamento das crianças, que deviam se comportar adequadamente, e ponto final. Os professores faziam seu trabalho e pouco era questionado pelas famílias sobre a metodologia da escola. Estava claro que a escola sabia o que fazer e que a família tinha outro papel social.
Mais de 100 anos depois e, naturalmente, com o progresso da sociedade, entendemos – e até parece óbvio nos dias de hoje – que as crianças devem ser ouvidas em suas necessidades e que as relações humanas, entre pais e filhos, por exemplo, devem ser construídas com base no respeito e na cooperação.
Refletindo sobre tudo isso a partir dos dilemas de tantas famílias com as quais convivemos no Mamusca, o que nos chama mais atenção é que, apesar de estarmos vivendo um tempo mais livre, talvez nunca se exigiu tanta perfeição de um pai e uma mãe na educação de seus filhos. Não se pode errar. O que nos parece é que, apesar de tanta informação, está tudo bem mais confuso.
O que fazer? Como sair disso? Sugerimos que, a cada vez que um dilema aparecer, que cada um, seja mãe ou pai, tente se escutar, se olhar. Para, assim, encontrarem suas respostas. Dentro de si e não fora.
Por que tal comportamento lhe incomoda tanto? Por que você valoriza mais os sonhos de um filho do que de outro? Por que parece mais prático deixar assistir TV ao invés de conversar? Por que você não consegue deixar seu filho dormir sozinho? O que esse choro mobiliza em você? O que lhe aflige? Do que você, adulto, tem medo? Etc. etc. etc.
Nos tempos atuais em que tudo pode, tudo é aceito, parece faltar coerência. Parece faltar percepção de quem somos, e há uma busca incessante de soluções mágicas externas a nós. A técnica perfeita para dormir, a técnica para comer infalível, a dica incrível para evitar birras, etc. Tudo externo a nós mesmos.
Lemos, estudamos, mas pouco nos olhamos.
Defendemos, com todas as forças, a liberdade das crianças em escolher, em sentir, em manifestar suas necessidades, mas isso nada tem a ver com educar crianças que não conhecem limites de si e do outro.
As respostas talvez sejam mais simples do que parecem. Se resgatando o passado e analisando o presente, pudéssemos refletir criticamente sobre como somos frutos de um determinado momento histórico, talvez o que hoje nos parece tão obvio, pode não ser bem assim.
No Mamusca, defendemos a conexão amorosa e verdadeira como caminho para tantas respostas e dilemas na educação dos filhos. Estar junto, presente, ouvindo atentamente as suas e as necessidades do seu filho. Fazendo um esforço imenso de discriminar uma da outra.
Oferecemos espaço e tempo para a escuta, para troca de olhar, para se conectar verdadeiramente com seu filho e encontrar as suas respostas em você, nele e na relação com ele. Dia a dia. O tempo todo.
A graça do nosso tempo parece ser essa: não há certo e errado. Não há um único jeito de fazer.
Que difícil, então! E se há tantos caminhos a seguir, siga, então, o seu! Mas, antes de mais nada, descubra qual é! Você precisa saber quem você é, saber qual é o seu modo de pensar e no que você acredita. O que você espera, acredita, sente? O que lhe mobiliza, o que causa dor, satisfação, alegria? Como foi sua infância? Que marcas ela deixou? Etc. etc.
Não entendemos mais o passado como positivo, já sabemos o preço que se paga por silenciar um desejo, um sentimento. Somos pessoas muito mais críticas hoje em dia. Porém, nos parece necessário estar bem preparado psiquicamente para aproveitar verdadeiramente esses maravilhosos encontros entre adultos e crianças.
Educar os filhos pode e é uma enorme oportunidade de nos (re)conhecermos como seres transformadores no mundo.