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É preciso retomar o protagonismo da mulher no parto

Foto em preto e branco mostra mãe deitada em uma maca segurando um recém sob seu corpo e colocando sua mão direita na cabeça dele.

“Vamos deixar o bebê. E entregá-lo, por alguns momentos, à mãe, depois de ele ter provado as alegrias da solidão, da imobilidade. Deitado sobre o peito querido, orelha contra coração, o bebê reencontra o som e o ritmo familiar. Tudo está feito. Tudo é perfeito. Esses dois seres que lutaram corajosamente, transformam-se num só.”

O trechinho acima faz parte do livro “Nascer Sorrindo”, do obstetra francês Frederick Leboyer, e representa um momento que deveria ser absolutamente comum: a humanização do nascimento. O modelo de parto que predomina no Brasil ainda é de práticas invasivas e de que não são recomendadas pelo Ministério da Saúde: uma em cada quatro mulheres sofre algum tipo de violência durante o parto no Brasil, segundo a pesquisa “Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado”, divulgada em 2010 pela Fundação Perseu Abramo.

Para entender os porquês disso e propor caminhos de retomada de um nascer mais humano e saudável, é preciso falar sobre o protagonismo da mulher no parto – ou, melhor dizendo, sobre a falta dele.

Em parceria com o Unicef – Fundo das Nações Unidas para a Infância -, produzimos uma série de conteúdos para disseminar a proposta da campanha Quem espera espera. Para esta matéria, conversamos com a obstetriz Ana Cristina Duarte, coordenadora do GAMA – Grupo de Apoio à Maternidade Ativa.

Kalu Gonçalves/Vila Mamífera

O contato pele a pele da mãe com o bebê nos primeiros instantes de vida é fundamental para estabelecer as bases emocionais que ele vai levar para a vida toda.

O direito de ter escolha

Segundo a OMS – Organização Mundial de Saúde – , o Brasil é o segundo país do mundo que mais faz cesáreas (56%), atrás apenas da República Dominicana, (58%) e compartilhando estatísticas com países mais pobres, como Equador (41%) e Colômbia (46%). A taxa recomendada pela OMS para o total de nascidos é de 15%.

Apesar disso, há sinais de retomada. Em março deste ano, o Ministério da Saúde revelou uma estabilização no número de cesarianas realizadas na rede pública e privada de saúde. Isso significa que, desde 2010, é a primeira vez que este índice não cresce.

Por que 15%? A cada 100 bebês que nascem, 15 podem nascer por meio de cesárea. Essa é a orientação da OMS. Mas de onde vem esse número? Segundo a organização, não há evidências de redução de mortalidade no parto em índices maiores do que este. Ou seja, o parto é um movimento espontâneo e natural do corpo, que só deve ser cirúrgico quando houver risco real para a gestante ou o bebê. Tudo o que foge disso é excesso e deve ser feito com a devida consciência dos possíveis riscos.

É possível, sim, questionar o que dizem os médicos

Ana Cristina explica que não importa onde o parto acontece, e sim como ele acontece. Por isso, durante toda a gestação até o momento do parto, é importante que a mulher esteja bem informada sobre tudo aquilo que ela pode e deve perguntar, duvidar e querer fazer de outro jeito. Segundo ela, a manutenção das incertezas e do medo é uma das principais ferramentas para tornar a mulher dependente dos mandos e desmandos da assistência obstétrica.

iStock

Além da mulher, o bebê que nasce também é um sujeito de direitos, e deve ser tratado com respeito, cuidado e delicadeza.

“É fundamental que as mulheres entendam que o obstetra, a enfermeira, a parteira, a doula e toda a equipe médica são antes de tudo prestadores de serviço. A mulher é uma cliente, e como tal tem direito a informações e escolhas. . Ele sabe tudo e a mãe não sabe nada”, explica Ana Cristina, que é também coordenadora do Siaparto (Simpósio Internacional de Assistência ao Parto) e autora do livro “Parto Normal ou Cesárea? O que toda mulher deve saber (e todo homem também)”

“Não deixamos nosso carro para consertar em qualquer lugar, e frequentemente questionamos a visão daquele profissional. Mas quando se trata da gestação, temos uma facilidade muito grande de deixar de lado esses questionamentos”

“Essa relação precisa mudar. Não pode ser uma relação de poder onde um sabe mais do que o outro, e sim de parceria e troca de informações. As mulheres devem poder fazer as suas escolhas junto a equipes que as respeitem”, defende.

Leia a entrevista completa com a obstetriz Ana Cristina Duarte

 

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