Começa amanhã, dia 20, no Rio de Janeiro, o II Seminário Criança e Natureza. Organizado pelo projeto Criança e Natureza e com o tema “desemparedar a infância”, o evento discutirá formas de aproximar a criança da natureza nas mais diferentes esferas, como educação, saúde e urbanismo.
No gancho do seminário, o Lunetas conversou com a Maria Isabel Barros, pesquisadora e consultora do programa Criança e Natureza sobre infância, confira a seguir:
O que é ser criança para você?
Uma das mais famosas citações sobre o valor do mundo natural vem de Henry Thoreau, poeta, filósofo e naturalista que ajudou a forjar a forma como entendemos hoje a necessidade de conservar a natureza: In wildness is the preservation of the world, traduzido livremente como “Na dimensão selvagem está a preservação do mundo”. Para mim, ser criança é nos aproximar ao máximo dessa dimensão selvagem, é um estado de ser, definido primordialmente por liberdade, automotivação e auto-organização
“Para mim a criança é um ser potente, autônomo, livre e auto-organizado, que tem sede de vida, de desafios, de se apropriar do mundo pelo movimento de seu corpo”
Na era da informação, qual o papel da escola e dos educadores na vida da criança?
Eu acredito que as crianças devem ir à escola para estudar e aprender. Mas também acho que as escolas devem se propor a oferecer o que falta na infância. Nos dias atuais, isso significa tempo e espaço para brincarem com meninos e meninas de diferentes idades entregando-se à aventura de fazer a si mesmo.
Importância de tempo livre x Cada vez menos tempo disponível. Como resolver este impasse?
Acho que precisamos dar pequenos passos, sem ter a expectativa que vamos conseguir ter um monte de tempo livre de um dia para outro. Lembrar que menos é mais e tentar cuidar melhor da agenda da família, preservando tempo sem programação, de ócio mesmo, para todo mundo. E ao mesmo tempo advogar por mais tempo na vida das crianças, e de todos nós. Onde quer que você exerça influência – nas reuniões da escola, no grupo de pais, no seu bairro, rua, prédio ou condomínio – peça por mais mobilidade urbana, por jornadas de trabalho mais equilibradas, por mais tempo livre nas rotinas escolares.
Igualdade entre meninos e meninas. Qual a importância de discutir este assunto com os pequenos?
Colocar esse tema em pauta ajuda a fortalecer um aspecto fundamental na busca por um mundo mais humano: o respeito ao próximo, o respeito às escolhas de cada indivíduo. Nesse processo precisamos ouvir, conversar e compartilhar ideias.
“Alimentar as crianças com referências de igualdade e de respeito à diversidade”
Mostrar com ações e exemplos que todos nós, adultos e crianças, devemos poder nos expressar com liberdade e independência, escolhendo nossos caminhos de acordo com o que nos move, o que faz sentido para nós, e não presos aos estereótipos sobre o que é “de menino” ou “de menina”.
Uma sociedade que valoriza a infância é…
Uma sociedade que reata os laços de tempo-espaço entre a criança e a natureza. Concretamente falando: precisamos de áreas verdes nas grandes cidades, de espaços e elementos naturais nas instituições de ensino e cuidado, de praças, parques e locais de convívio entre famílias e crianças de diferentes idades.
“Espaço e tempo para brincar com liberdade e autonomia de movimento e ação”
Essa é a reflexão que queremos propor a todos as pessoas comprometidas com a concepção de uma criança ativa, potente, produtora de cultura e com necessidade e possibilidade de viver em contato diário com a natureza.
Vínculo: em uma sociedade que privilegia cada vez o trabalho e consumo, como cuidar das relações e convívio com as crianças?
“Precisamos acreditar que estabelecer vínculos não custa caro”
A criança não precisa viajar para longe ou ter o brinquedo ou a tecnologia de ultima geração. Ela precisa de um adulto de referência interessado genuinamente em estar com ela, compartilhar com ela seu encanto pela vida e pelo mundo. Adultos capazes de encontrar o equilíbrio entre ambientes preparados e o caos imprevisível da natureza; mediação e auto-regulação; estímulos e tédio; segurança e risco; presença e ausência. Capazes de aceitar ter menos controle sobre as crianças e deixar que elas sejam o que podem ser: autônomas, mestres, espontâneas, competentes e livres.