“Seja aquilo que você quiser!” Este é o conselho que todas as mulheres gostariam de ter ouvido quando crianças. Hoje, o imperativo ecoa com maior naturalidade. Mas isso não significa que ele seja suficiente para que meninas, de fato, cresçam e sejam protagonistas de oportunidades futuras. A desigualdade entre homens e mulheres é um problema histórico e se reflete de múltiplas maneiras nas esferas sociais. Seja na sub-representação política, nos índices de violência ou no trabalho doméstico não remunerado. Não à toa, a promoção da igualdade de gênero se tornou um Objetivo do Desenvolvimento Sustentável, integrando a Agenda 2030 da ONU. Por isso, neste 8 de março, o Lunetas mapeou 12 projetos que fortalecem meninas e jovens mulheres no Brasil.
Mas o que as meninas pensam sobre os problemas que as atingem? Em 2021, o tema foi foco do estudo “Direitos das meninas para um futuro com igualdade: compromissos na América Latina e no Caribe”, desenvolvido pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que consultou adolescentes, líderes de organizações feministas e especialistas no assunto. Entre as principais reclamações, estavam o tratamento desigual na família, a insegurança em relação à violência sexual, além do fato de terem suas opiniões consideradas de forma limitada na elaboração de políticas públicas. Diante deste cenário, fica evidente que a redução das desigualdades precisa ser pensada desde a infância.
Projetos para meninas e jovens mulheres
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1. Empodera – Hoje menina, amanhã mulher
Casamento precoce, violência e gravidez não intencional são alguns dos cenários que ainda atingem adolescentes e jovens mulheres no Brasil. Estes indicadores levaram o Unicef a criar o projeto “Empodera – Hoje menina, amanhã mulher”. Em 2017, em três territórios do Recife, onde 16% das mães de nascidos vivos tinham entre 10 e 19 anos, segundo a Secretaria Municipal de Saúde. O projeto trabalha com oficinas de formação e empoderamento de meninas, meninos e gestores públicos, discutindo temas como respeito às diferenças, masculinidades, violência contra mulher, participação social e cidadania.
De acordo com dados da OMS, de 2017, 1 em cada 3 mulheres, em todo o mundo, sofreu violência física e/ou sexual por parte do parceiro ou de terceiros durante a vida. Em 2015, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) apontou que a prevalência de casamentos na infância e adolescência (abaixo dos 18 anos) era de 19,7%, e que 75% das meninas entre 10 e 17 anos que tinham filhos não frequentavam a escola.
“A partir do projeto, muitas meninas perceberam que viviam situação de violência doméstica, fortaleceram seu lugar de fala e se sentiram mais seguras para denunciar”, relata a oficial do Programa de Cidadania dos Adolescentes do Unicef, Luiza Leitão. Além de ser implementado em outras cidades, como Salvador (BA), Belém (PA) e São Luiz (MA), o trabalho intersetorial do “Empodera – Hoje menina, amanhã mulher”, no Recife, passou a inspirar ações da gestão municipal direcionadas para meninas menores de 18 anos na implementação de políticas públicas.
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2. Topity
Você já pensou em viver uma experiência digital de estímulo da autoestima? O “Topity” é um jogo que mistura conversas dentro do WhatsApp e do Messenger. Nele, as meninas aprendem, se divertem e saem mais fortes a cada desafio. São oito fases a serem superadas: aparência não é tudo; meu corpo, minhas regras; a arte de não se comparar; desafio do espelho; redemoinho de likes; por trás das propagandas; desista de desistir; tudo que você é capaz. O game teve origem num trabalho de escuta do Unicef sobre medos e autoestima com adolescentes de todas as regiões do Brasil.
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3. Meninas em rede
A internet também é um ambiente que gera insegurança para crianças e adolescentes. Especialmente para meninas que se mobilizam para enfrentar situações de violência on-line. Criado pela Safernet Brasil, em parceria com o Unicef, o “Meninas em rede” é um guia de segurança que traz dicas de como usar as redes com liberdade e direitos garantidos. O material apresenta um glossário sobre os tipos de violência mais comuns, uma lista de leis que protegem as vítimas, e um passo a passo sobre como agir diante desses casos. Para quem pensa em criar um projeto com esse público-alvo, o “Meninas em rede” pode ser consultado para mapear e diagnosticar as redes de proteção e apoio na sua região. Adequando a luta pelos direitos de meninas e mulheres à realidade local.
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4. Criativos da escola
O “Criativos da escola” é um programa do Instituto Alana, criado em 2015, e que faz parte do Design for Change, movimento global presente em 65 países. A iniciativa já envolveu mais de 48 mil estudantes, recebendo projetos pensados por crianças e adolescentes para a transformação de suas realidades, em pelo menos 1.172 municípios do Brasil. Por meio do Desafio Criativos da Escola, o programa reconhece o protagonismo e a participação de jovens que estão engajados na luta pela equidade de gênero.
“Desde muito novas, meninas já experienciam a desigualdade de gênero em suas vidas. No ambiente escolar, não é diferente. Justamente por esse motivo, a escola é espaço propício para debate e para transformação”, afirma o coordenador de projetos do Criativos da escola, Gabriel Salgado. Em sua última edição, em 2021, o prêmio destacou nove projetos de estudantes dos Ensinos Fundamental e Médio com foco no combate à violência contra meninas, pobreza menstrual. É um fenômeno transdisciplinar e multidimensional, vivenciado por meninas e mulheres devido à falta de acesso a recursos, infraestrutura e conhecimento para que tenham plena capacidade de cuidar da sua menstruação, e incentivo à participação de mulheres na ciência.
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5. Meninas da física
Criado em dezembro de 2017 por alunas e professores do Instituto de Física da Universidade Federal de Uberlândia (Infis-UFU), o projeto Meninas da física destaca a atuação de mulheres na ciência, especialmente nas áreas de exatas, buscando atrair o público feminino para as universidades. Atualmente, pertence a 37 instituições de ensino diferentes, em 9 estados, e na França. Atua por meio de palestras, minicursos, informativos, monitoria voluntária, material de estudos e criação de conteúdo multimídia para as redes sociais com experimentos e temas relacionados à ciència.
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6. ElaSTEMpoder
O projeto surgiu em janeiro de 2020, a partir da participação de seis jovens na Conferência Virtual de Protagonismo Juvenil (CPJ). O objetivo do “Elas têm poder” é promover a maior participação feminina dentro das áreas de Stem (Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática) a partir da geração de oportunidades para meninas e mulheres. O projeto também envolve discussões on-line para conscientização das pessoas sobre o assunto.
Para uma das jovens fundadoras, Aline Montenegro, a predominância de homens em posições de tomada de decisão ainda é uma barreira para solucionar problemas enfrentados por mulheres. “Gosto de pensar num espaço mais diverso para o Stem futuro, com mais representatividade feminina. Sonho com um Brasil que invista mais na ciência para evitar a saída de mentes tão brilhantes para outros países. E evitar que a academia seja um local elitista”, defende.
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7. Força meninas
“Força meninas” é uma plataforma de impacto social com foco na capacitação de meninas de 6 a 19 anos. Para que se tornem protagonistas de oportunidades futuras, por meio do prêmio “Mude o mundo como uma menina”. A iniciativa contempla cinco projetos e ações nas categorias criativa, determinada, líder, pioneira e visionária. Durante o programa, são desenvolvidas competências sociais, emocionais, entre outras habilidades essenciais para o século 21, a partir de desafios que abordam a resolução de problemas reais. Desde sua criação em 2016, mais de 45 mil meninas participaram, em 12 estados e 22 cidades do Brasil.
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8. Girls Rock Camp
Um acampamento com muita diversão e música! Apesar de ser uma organização sem fins lucrativos, o “Girls Rock Camp Brasil” inspira atividades autônomas em todo o Brasil. Sua missão é empoderar e promover a autoestima de meninas e mulheres por meio da educação musical e do pensamento crítico. Nos acampamentos, são ensinadas noções básicas de instrumentos como guitarra, bateria, baixo, teclado e voz. Durante uma semana de oficinas de arte, esporte, e que trabalham imagem e identidade entre as meninas.
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9. Escola de liderança para meninas
As próximas três iniciativas mapeadas são da Plan Internacional, organização pioneira no Brasil em projetos voltados para o empoderamento de meninas. A pesquisa “Por ser menina no Brasil: crescendo entre direitos e violências”, desenvolvida em 2014, em parceria com a empresa Socializare, foi um dos primeiros diagnósticos que evidenciou o empoderamento como questão central. Para o avanço na construção do protagonismo e direito à expressão de meninas.
A coordenadora de projetos da Plan Internacional, Ana Nery Lima, explica que o processo de empoderamento de meninas acontece quando elas acessam ou conquistam espaços sociais. E podem questionar ou confrontar padrões de poder desiguais e discriminatórios, como racismo, machismo e LGBTfobia, por exemplo.
“Empoderar significa tanto descentralizar poderes quanto o desenvolvimento dos indivíduos por meio do seu próprio fortalecimento, de suas habilidades, das suas potências e capacidades. Em outra perspectiva, mais coletiva, podemos compreender o empoderamento para além dos processos individuais. Como o fortalecimento da força social, política e econômica de um grupo”, afirma.
O projeto “Escola de liderança para meninas” nasceu em 2016, em seis municípios do Maranhão: São Luís, São José de Ribamar, Paço de Lumiar, Codó, Timbiras e Peritoró. Sua metodologia inclui ciclos de oficinas sobre temas como direitos, cidadania, advocacy, habilidades para a vida e políticas públicas. Bem como a promoção de eventos públicos que envolvem meninas entre 15 e 19 anos, o poder público municipal e estadual, conselhos estaduais e órgãos do Sistema de garantia de direitos.
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10. Meninas líderes
Essa não é apenas uma plataforma, mas um ponto de encontro digital para meninas de todo o país discutirem igualdade de gênero, compartilharem experiências e trocarem conhecimento. Ali, jornalistas, influenciadoras, blogueiras e meninas que participam dos projetos da Plan Internacional produzem conteúdos em torno de temas como empoderamento, direito e igualdade de gênero. O canal possui diversas áreas de interação, por exemplo, um espaço para desabafos e pedidos de ajuda para enfrentar problemas como violência, assédio, escola e famílias. Também há dicas sobre entretenimento e cultura, um espaço para publicação de editais e iniciativas, bem como uma agenda para eventos relacionados às temáticas discutidas. Em 2020, foi criado o podcast “Meninas líderes”, que aborda temas propostos por elas.
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11. Meninas ocupam
Ocupar assembleias legislativas, ministérios públicos, defensorias, secretarias de estado, institutos federais e diversos outros espaços de poder majoritariamente masculinos. Essa é a missão do “Meninas ocupam”, um movimento em que meninas e jovens mulheres assumem, por algumas horas, cargos de liderança em instituições públicas e privadas. Em 2021, aproximadamente 60 meninas do Maranhão, de São Paulo, do Piauí e da Bahia protagonizaram 69 ocupações.
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12. Meninas em movimento
“Meninas em movimento” é um projeto realizado pela ActionAid, com o patrocínio da Petrobras e do Governo Federa. Com o objetivo de fortalecer os direitos de meninas e mulheres e enfrentar a violência sexual, no Recife e no litoral sul de Pernambuco. A iniciativa, que elaborou um processo de escuta local para a identificação de problemas comuns nos territórios de trabalho. E busca oportunidades de incidir sobre temas como violência, evasão escolar e falta de acesso à saúde e à rede de apoio para mães. A expectativa, de acordo com informações da ActionAid, é construir caminhos para que as participantes se tornem engajadas na cobrança, monitoramento e construção de políticas públicas.
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Mulheres na ciência
Segundo dados da Unesco, estima-se que apenas 30% dos cientistas do mundo sejam mulheres. No Brasil, o número de mulheres bolsistas em iniciação científica e com mestrado e doutorado é superior ao de homens. Apesar disso, elas representam apenas 33% do total de bolsistas de Produtividade em Pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão que incentiva a pesquisa no país. Na área das Ciências Exatas, Engenharia e Computação, 75% dos homens assinam os artigos, de acordo com dados do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações. Essa desigualdade é maior já que vários obstáculos impedem o acesso e a permanência das mulheres nas carreiras científicas e tecnológicas.